DRAGÕES À ESPADA E PUNHOS

Ouço a tua voz, na sala, estudando Enfermagem. Palavras saltitam, entrecortadas. Tarde-noite de outono e está frio. Engano o tempo sobre a cama, lendo os poetas portugueses vistos por Carlos Nejar.

O diabetes está manso e a hipertensão não está robusta. Engano os óculos com olhos que fingem ler.

A Medicina e a Enfermagem são esperanças pra tanta gente. Já não morrem tantos de varíola, tuberculose, inanição. Os índices estão um pouco apaziguados e a mortalidade infantil vem em decréscimo nas estatísticas. O analfabetismo apresenta lento recuo.

Quanto às enfermidades crônicas não me preocupo. Enquanto as doenças hibernagem, a chuva lá fora molha os canteiros plenos de terra preta, recentes. Recende no ar a vida nas begônias, nos hibiscos, bromélias e espadas-de-são jorge.

É abril, quase data do santo que elimina animais que cospem fogo pela boca. Eu também, quase todos os dias, domino dragões à espada e punhos. Luto pela vida com vigor, mesmo que parecendo morto. Feito raízes no jardim.

E eu que queria a morte muito antes que a “tinhosa” de vez me pegasse. Talvez a pudesse enganar como as raízes sob a luz, entranhadas no solo.

As ramas, larvas em conluio com a luz, planejam o explodir de uma nova flor ainda durante a manhã seguinte. E o sol, à mesma hora, enrubescerá as bochechas em novo bom-dia...

Alguns saúdam a Poesia com a esperança de que o Amor ainda seja vida em flor. Muitos vivem e morrem nessa esperança.

– Do LIVRO DOS AFETOS, 2005/2009.

http://www.recantodasletras.com.br/prosapoetica/1803457