QUEM É DO CRIME TEM SANGUE NOS OLHOS

Quem é do crime tem sangue nos olhos. É mais gato. Tem pulo nos pés. Neste mundo de veneno tem Guetz, 32 anos, prostituta da Cracolância, aquele trecho de submundo em pleno Centro, bairro da Luz. Ali não têm vento, tudo se abafa naqueles cantos escuros. A voz muda nos fundos, o tráfico solto, o crack nos quartinhos dos hotéis e nas ruas, no cachimbo, de boca em boca, das crianças esquálidas e depois caídas em bando apagadas.

Para Guetz toda sociedade é ganso, é dedo. Aponta. Quer entregar os irmãos. E aí a gente se fode: prostituta, travesti, traficante, a gente fica foda.

Ela não nega o seu destino, desatino.

– Sou prostituta. Sou do crime, é de sangue, de pai, sei lá...Gosto disso, de sentir a encrenca, a energia, o fogo, a magia do inferno, desse mundo de pedra, crack – esse cristal barato que explode dentro.

Pra Guetz, Deus fez tudo e fez também a droga, pra dar alegria a quem não tem mais nada.

- Neste mundo tem que ser ligeira, inda mais quando a gente tá fumada, aí tem que estar conectada ou vira nada, rápido.

Sobre desejo diz que não está querendo desejar muito não.

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Texto feito sobre reportagem, vide O Estado de S. Paulo, 07/05/2006, Cidades.