Já passa da hora

As coisas que nos fizemos marcaram. A ambos. Tal é nossa dor que demonstramos em entresorrisos, em entreolhares e entrecumprimentos a outros estranhos que não nos reconhecemos por vezes. Falar em amor é como falar de espinhos. E como tentamos não nos machucar tocando um no outro... quanta inocência, que tolice.

Olho você passar e me calo. Você atravessa em largos passos. Nós relembramos e desejamos esquecer, tamanha a fobia do retorno. Queremos sufocar paulatinamente, como em homicídio asfixioso, ou ao menos neutralizar ao máximo a tensão do grito em ataraxia todo e qualquer fenômeno que emane de nosso encontro. Tentamos por meses, dias, horas nos evitar, quando sentimos o controle, vem o reencontro... não temos mais tempo para mais um dia de esforço.

Vejo que você está lindo. Eu também estou. Vejo que ainda nos comovemos. Eu também te quero. Mas como somos tolos, sabemos bem que não lidamos com algo maior que nós, por isso nos afastamos, nos queremos longe, atravessamos a rua, entreolhamos, entrecruzamos, entresorrimos e entrecumprimentamos pessoas estranhas, sempre direta ou indiretamente desejando que o gesto chegue até nós, no silencio do comentário indireto no corredor de algum lugar.

E em silêncio circulamos por territórios que nos pertence, porque no fundo, não nos soltamos. Só deixamos a corda arrebentar, mas a sensação do remendar é do passado, e como uma força, é com ele que devemos nos entender, essa correnteza da impulsividade que nos irracionaliza.

Só que não precisamos mais prestar tal papel ridículo. Apenas observamos de longe, um ao outro, nossas próximas ligações, e desejamos que possamos, com nossa autorização um ao outro, seguir adiante. Por isso peço, me queira indo. Me aceite livre. Que eu me permito daqui.