[Defina-me!]
Eu contemplo — contemplo as águas claras,
a extensa viagem do grande rio da fronteira —
um rio, sempre, sempre está na fronteira
por mais que a geografia diga o contrário!
De súbito, mansa como o rio,
tu chegas devagar, vens sobre mim,
e te esforças em tomar o meu ponto de vista,
mas, assim como o grande rio da fronteira,
tu não podes carregar as minhas dores.
E agora, por sobre os meus ombros,
juntas, no longe, o teu olhar com o meu;
e o teu olhar me apalpa, pondera, tem peso...
Então, as minhas lágrimas caem n'água,
tua imagem se desfaz num estremecimento,
e eu torno a ficar na margem, sozinho,
clamando para o surdo rio que passa,
e corre, e corre, e corre... sem cessar.
Não; não tenho jamais uma definição de mim,
como o grande rio, estou sempre na fronteira,
no limiar mágico do nunca-saber de mim,
não posso saber senão por ti — defina-me!
[Penas do Desterro, 29 de julho de 2009]