À BEIRA DO FÉRETRO

Quando morrer

à beira do féretro

em consolo à viúva

conforto dos órfãos

dirão:

foi misericordioso e justo !

humilde e caridoso !

sábio e competente !

um visionário !

pai carinhoso !

Deus o tenha nessa conta

em seu julgamento !”

Se for certo que se desliga o corpo da alma

estarei ali ouvindo

impassível e imóvel de corpo

sem direito a voz e gestos

mas em espírito tomara que possa apurar

pelas rodas de velório

o que dizem de morto:

Na roda de amigos e credores:

humilde ? qual o que !

travestia, sim, a vaidade !

gabava-se sábio

uma pseudo-intelectualidade arrogante

Contas não saldava

pelo menos comigo não honrou ...

Fala-se, à boca miúda,

que foi corno manso...

mas era piedoso !

Pobre diabo ir, assim,

com tantas pendências

que a terra lhe seja leve...

ao menos !

Na roda da família:

nosso irmão se foi, assim sem avisar.

Quem deixa o mundo assim

Pode não ter tido tempo de quitar todas as dívidas.

Alguém pergunte á viúva se ficou seguro, pensão

e economias para as despesas urgentes

Deus proverá as faltas dessa boa alma

E nos livrará do rateio.