RÉQUIEM PARA OS POBRES VERSOS
“requiem aeternam dona eis”
O poeta comete injustiças e finge que não vê.
Somente, expõe na vitrine da sua loja de fantasias
aquilo que lhe parece belo - um exibicionista!
Almeja uma construção poética, lírica
e descarta, humilha, assassina alguns versos
que lhe parecem indevidos – perverso,
e atira-os no lixo como um restolho qualquer.
Pobres palavras !
São chamadas à vida, arrancadas do seu espaço etéreo,
invocadas a trabalhar para o feiticeiro das rimas
e, não se enquadrando nos propósitos do rufião literato
são devolvidas a um tempo qualquer – um nada maior.
São substituídas por possíveis atores mais cênicos
- não recebem, sequer um: - obrigado !
Concluída a obra final – uma escultura de letras,
nem mesmo para pedestal elas servem,
- são tangidas para longe como escravos indolentes.
Como é cruel o poeta – indecente, diria
aproveita-se da fidelidade canina destas serviçais
que, mesmo escorraçadas, banidas
retornam, ao primeiro chamado do farsante
e voltam a servi-lo na ânsia de serem úteis.
Perdoem-me letras não empregadas
perdoem-me frases destroçadas
perdoem-me estrofes defenestradas
perdoem-me versos descartados
perdoem-me poemas inacabados.
Nas noites de insônia, pressinto a presença de vocês
rodeando-me e rangendo correntes como zumbis
- mortos-vivos, a me impor castigos e medos.