"Cheiro de mulher"
E findando a luz do Sol, contive-me diante do fio da vida que em sobeja, prorrogava meus suspiros de adolescente. Retardei o quanto pude, o nascimento da mulher em mim: e fiz-me renascer já menina.
A puberdade resvalou nos medos, iniciados mediante o arredondamento dos meus seios. Medo de crescer, de amar, de sofrer, de sentir a dor que ouvia das bocas odiosas de mulheres velhas, não pelas rugas que já lhes cobriam, mas velhas de memórias, de sonhos; eram as mulheres pudicas que me amedrontavam.
Eu tinha amêndoas nos olhos, hortelã era meu cheiro, eu vestia algodão e calçava seda nos pés: era tão pura quanto a virgem fazenda que me cobria o corpo; mas fui me transformando.... passei, com a putável necessidade de envelhecer, a ter cerejas nos olhos, meu cheiro já não era ameno, era a madeira que revestia minha pele, eu cheirava à madeira nobre; meus vestidos tornaram-se transparentes, e poucos; meus pés ostentavam a altura – sentia-me altiva com a czarina.
Os anos caminharam, meus desejos correram, e atropelaram a cautela: tornei-me imprudentemente mulher: não adormecia, cochilava com os olhos arqueados diante da Lua. Era ela, que em bola cheia, me guardava. Eu e a Lua, a Lua e meus desvios... a testemunha dos meus atos ilícitos.
Hoje, os meus trinta e seis anos acumulam a menina dos olhos amendoados e a mulher que cheira à madeira: ainda vivo o fervor da libido, e aprendi a defender a soberania de ser eternamente fêmea. E perpétua seja aquela que nunca sentiu o que eu senti e ainda sinto: a necessidade de ser mulher.