[E Agora, Carlos?]
E agora, Carlos, o que vai ser?
...e também, é só dizer que agora é tarde,
E estou desculpado pela inércia, pela fuga.
Deixo as palavras assim, como remendos sem nexo sobre um tecido sem definição - tarde, para quê? Inércia de quê, fuga de quê, ou de onde? Tenho desconfiança de que as minhas palavras ressoaram nas escassas mentes que as leram - ah, mais imprecisões! Desconfiança, escassas mentes, ressonâncias... Afinal, tudo [isto] resulta em nada, nada se aproveita deste discurso aleatóro - agora, exagerei, fui longe!
Dá o que pensar tanto esmar, tanto errar, tanto vagar...
Mas que é tarde, bem tarde, isto ninguém pode negar; é tarde para tentar de novo, tarde para amar de novo, tarde para jogar de novo - não há recomeços, há continuidade, pois o que morre, morto está, não pode portanto, recomeçar - ah, loucura de viver!
A comida de ontem, o requentado do amanhecido não serve de consolo - velhos sabores não voltam, amor do passado, ficou no passado, por que insistir? Na verdade, é melhor evitar definições... erraríamos, com certeza! Há tempo, há ser, e há vontade para [tentar] novos amores, no corpo já velho, habita um ser sem idade - só não vale perder o senso de [ser] ridículo - essa corrosão... Repiso: é tarde, então? Se há ser... como pode ser tarde?
Olha só: Minas ficou longe demais; o meu chalé amarelo ainda existe,
[Para quem não o viu, é igualzinho ao de Portinari, lá em Brodosqui], eu ainda sonho em voltar - nas noites, eu viajo até lá, viajo até a Minas que não há mais - assim, estou livre de perigos! Na verdade, eu estou falando à toa, a esmo, estou falando nada, quem ainda não me conhece, não vai conhecer mais, pois afinal, é tarde, bem tarde...
Teatro vazio, e agora, Carlos?
___________
[Penas do Desterro, 10 de julho de 2009]
PS em 6 de junho de 2012, constatei que o Chalé Amarelo foi derrubado