Sermão
E o senhor de bengala então disse,
pra quem (não) quisesse ouvir:
Este tempo não é meu
É o que deixo a vocês
Que não vem de graça
E não há que faça
Que seja meu outra vez!
Este tempo é de vocês
É este o tempo de criar
Quem tinha que sofrer, sofreu
Quem sofrerá ainda,
não será eu!
Mas que busquem nas luxúrias
Destas mil e uma ternuras
Que da vida se extrai
Todo o sentimento bom
Porque até mesmo este
Dia ou outro se esvai!
(Parou para respirar. Limpou a lágrima!)
Eis que vos convoco, todos
In loco, os reis, os tolos
E que admirem este tempo
Pois que este não voltará
Deixem que o futuro roube
Do presente este sabá
E que, em vida curta, que é
Se façam réus, reis, rainhas
Deixo que façam
Das tuas palavras as minhas
Que este velho homem que parte
Não vai pro céu nem pro inferno
Tampou pra Marte
Este velho homem caminhará
Por tempos imortais
Que são dos livros deixados
E que, então registrados, jamais
Meus escritos se perderão
Por este imenso chão
Onde pisou Nietzsche e Jesus
Cada um com sua cruz.
(Um olhar decadente, faminto!)
Este tempo não é meu
É o que deixo a vocês
Que não vem de graça
E não há que faça
Que seja meu outra vez!
Façam bem o que quiserem
Não estarei para reprovar
Mas as fontes, não sequem
Pois há quem ainda venha
Com o espírito a cantar,
Que o mundo gira em falso
E se achas que és Fausto
É que falta-lhe viver
Por seu tempo, que outro é
E, cada um com sua fé,
Faça-te viver, antes de orar.
(Levanta-se!)
Que rimas jogadas ao vento
Caiam sobre vossas cabeças ocas
Que nada que é desta geração, deste tempo
Estará incrédulo às outras.
(Caminhou até cansar. E por ali, eternizou-se!)