O Anoitecer da Cidade
Vejo da janela o anoitecer da cidade... O anoitecer é sempre poético: começa com o crepúsculo, esse lento espetáculo da aquarela celeste e se conclui com as repousantes (mas irriquietas) trevas da noite. Derrama-se, gradualmente, o pálio da escuridão e, de mansinho, começa a soprar a brisa noturna...
O anoitecer da cidade e na cidade tem vida própria. Sempre de um dos lados de cada uma das colossais avenidas, segue uma vagarosa e metálica procissão automobilística rumo a tantos e tantos lares. No ar, soa uma eriçada e pós-moderna orquestra de estridentes buzinas. Uma ou outra sirene complementam os arranjos. Os anúncios de neon esboçam a paisagem pop em que tem palco o show da vida noturna.
Mas, cá detrás da janela fechada, ainda no escritório, mal consigo ouvir os sons da noite. Placidamente, distraio-me a contemplar a cidade que anoitece, belamente, por cima e por baixo de seus habitantes... Cá de cima, não se vêem as faces, os sorrisos ou as lágrimas de quem caminha na multidão. Quantos dos que seguem no engenho do dia que termina não desejariam cantar, chorar ou gritar?
Mas, cá de cima, mal se vê a multidão. A multidão se perde em meio às luzes e sombras da noite. Noite que chega para os que cantam, choram ou gritam; e, ainda, para os que ficam em silêncio... Chega para todos o consolo da noite e o afagar do escurecer. Com a noite, vêm o fim das dores de um dia e a esperança do amanhã...
E, enquanto tudo isso acontece, com suas tantas luzes em meio às trevas, a cidade tenta imitar o céu...