Coleção
Enfim resolvi ver, depois de tanto lembrar, aquele passado eternizado nas páginas dos livros da minha coleção. Li e reli os volumes mais antigos e chorei os reeditados, que não foram poucos. Tirei o pó e procurei os contos mais cômicos. Ri e refiz o perfil dos personagens principais. Desenhei cada um deles sobre os rascunhos da minha memória.
Nas primeiras páginas pude encontrar as pessoas e as coisas às quais eu dediquei minha obra. Nos prólogos, bem pouco de mim, muito pouco. No índice estavam, um a um, os capítulos da minha vida e seus títulos eram pensamentos meus. As ilustrações traziam cada rosto, cada paisagem, cada fase da lua, todos os meus sonhos. Dava pra sentir as emoções mais fortes brotarem das entrelinhas e inundarem as folhas que guardam histórias inalteradas, que nunca foram e nem poderiam ser apagadas.
Existiam trilogias, monólogos, diálogos e algumas partes em volume único. Estes eram especiais, singulares, dos quais nenhum momento poderia se aproximar: únicos.As crônicas mais interessantes, em negrito. As que eu preferia esquecer, mal impressas, mas visíveis.
Na capa estávamos eu e muitas outras faces que alguém ousou dizer que eram minhas. Na contracapa, dados que eu já não lembrava que eram meus e minhas dores: páginas molhadas pelas lágrimas que derramei por mim, por vocês, por nós.
Vi o volume dezoito completamente vazio e sem brilho. E quase no fim do dezessete estava eu, me vendo dentro de um livro, com outro livro nas mãos, e outro, e dentro deste mais outro. Na página seguinte linhas em branco: estava sentada sobre o presente.
21/08/03