Compulsão poética
Sobre o mundo que me é permitido conhecer
construo longos textos mentais.
Ideías transformam-se em teses definitivas.
Logo substituídas por antíteses irrebatíveis.
E, mal se transformam em sínteses elucidativas
já são novas teses com gosto de ponto final.
Assim, quando as páginas em branco preparam-se
para receber todo um mundo de conclusões,
ensaios, resenhas, roteiros, longas dissertações...
vem a poesia, insistente, atropelando tudo.
E, a tudo reduz, segundo seus próprios critérios.
Vai buscar o sumo do fruto amadurecido
e deleita-se com o néctar da árdua reflexão.
Depois atira fora a casca, as sementes,
para digerir a polpa, que nunca alimenta por completo.
E assim,esse jejum de palavras,sempre pede mais.
Porque todas as doces, salgadas, apimentadas e ácidas palavras
ainda revoluteiam em torno das páginas vazias.
Todos os olhares, gestos, vozes,verdades, mentiras,
indignações, receios, rompantes, repressões, êxtases...
todas as mais solenes e justificadas queixas,gritam...
esperando sua vez de entrarem no poema.
No entanto, há quem escreva com mais propriedade sobre tudo isso...
Resta o desígnio de que não se pode fugir.
Uma aceitação da intensa subjetividade e fantasia
permeando a vida do poeta.
Um reconhecimento da única forma concreta
em que pode expressar suas vivências.
Resta ainda a opção de não faze-lo...
Não fora a saudável(?) compulsão
de preencher páginas em branco com delírios
em que até mesmo as mentes mais objetivas encontrarão refúgio.
Quando em uma noite fria, decidirem por um solitário recanto
um bom vinho e momentos de arroubo poético...
o que mais poderá aquecer o seu espírito?