Liturgia
Liturgia
6 de outubro de 88 9h noite
“Pálida estrela, casto olhar da noite,
diamante luminoso na
fronte azul do crepúsculo,
o que vês na planície?”
OSSIAN
Chegue à janela e olhe pra dentro
de minha pequena casa.
Aqui é o meu quarto
cheio de nada que interesses causem.
Logo adiante, há um pequeno corredor.
Em suas paredes nem um túmulo sequer
e é só porque não tenho memória.
Ali é a cozinha. Um velho fogão
e em cima da mesinha de madeira
o meu café da manhã.
É um pão com manteiga, uma xícara.
Mas você é esperto e observador
e nota que em cima da mesa
há um pequeno besourinho
redondo e alaranjado.
Você é observador e nota
as evoluções do bichinho.
Ele anda para lá e para cá;
faz círculos e acaba encontrando
uma faca escorada no pote de manteiga.
O bicho sobe por ali.
Num dado momento,
(devo repetir agora que você é muito observador)
diz você, o besouro para
em uma florzinha de metal esculpida na faca.
Bem, será isso poesia?
Um besouro namora a florzinha metálica.
O besouro segue, e você também.
Você tem + casas para entrar.
Essa é a minha janela e por ela você sai.
Num dia qualquer, ela ainda abrir-se-á.
Quem pode esclarecer tudo?
Ou sequer pensar nisso?
E que dizer dos que tentam?