FRIO
Por Vania de Castro
Sinto sono.
Propus-me a arrumar meu quarto
Arrumar para dormir
Esticar o lençol...
ajeitar os travesseiros
arrumar o lençol de cima e o edredon!
Noites frias e gostosas
gostosas para dormir numa cama quentinha
não sozinha
com alguém abraçadinha
sentindo pele com pele
a respiração
os movimentos
o bater do coração.
Sentir o que quiser
sem repressão
sem raiva
sem cara fechada
com amor e alegria.
Ao fundo ouço Elis Regina
cantando a beleza da vida
com voz recheada de vida
amor
alegria.
Penso ... penso no frio destas noites e
acredito que um novo ser humano surgirá
apenas se nós nos conscientizarmos
da necessidade do amor
seja amor romântico
fraterno
materno
Não importa!
Apenas amor
O amor contamina a todos que estão vivos
Sabemos que muitos vivos mortos existem
e ficam rondando silenciosamente
e observando os movimentos de cada um
para em determinado momento dar o bote
e destruir o outro
pura falta de vida
não sabem o que é viver
não querem saber o que é viver.
Ficam aprisionados
centrados em si,
o mundo existe apenas porque eles existem
e abandonam a beleza da existência humana
corrompem e são corrompidos
pelos dilemas existenciais e sociais
não sabem o que é solidariedade
não querem saber
não podem saber
sentem medo de dividir o que lhes pertence
e cooperam com a manutenção da desigualdade social
que assola o país.
Estão garantidos
e com o outro não se importam!
Se o colchão é no chão
ou se é gostoso o suficiente para que o sono seja reparador
dormem mesmo assim
sem preocupações.
E o dia amanhece claro
com um sol que é de todos e para todos
e um céu azul a banhar-nos com sua beleza e tranqüilidade.
Muitos morrem nestas noites frias
sozinhos
sem teto
sem o abraço quentinho
sem o calor humano
morrem no silêncio soturno da noite
e muitas vezes não percebemos
mesmo vivendo na mesma cidade
dividindo o mesmo espaço físico.
Egoísmo social!
Sofremos desta doença
Às vezes sem saber da sua existência!
sem teto
com frio
barriga vazia
fome
num país que muito tem
e aos poucos aquilo de belo que tem
está sendo tirado por alguns vorazes
que tudo querem para si.
A natureza é de todos e de qualquer um...
é verdade...
mas temos nossos direitos como nação
nossos deveres como cidadãos
os desejos que brotam do nosso coração.
E vamos vivendo com a escassez do amor fraterno no mercado
Afinal...é um produto que não tem preço,
portanto,
não pode ser comercializado e assim ... nada vale!
Vamos vivendo querendo fazer
mas nada fazendo
ou fazendo pouco ou
apenas sonhando com a mudança que um dia surgirá.
Será?
Se ninguém se mexer nada mudará!
Deixaremos esta herança necrosada e fétida para nossos filhos e netos
com remorso
sem remorso
Mas deixaremos se nada fizermos.
Apenas um exemplo:
Se cada pessoa que leva seu querido cachorro para passear na praça
levar também um saquinho e uma pazinha para recolher as sua fezes
a praça seria diferente
limpa
sem risco de sujar os pés com o cocô do cachorro de alguém!
Mas não é bem isto que ocorre
A praça...qualquer praça tornou-se
O cocosódromo dos queridos animais
Culpa deles????
Não!!!
Responsabilidade do próprio ser humano
que só pensa em si
como se vivesse sozinho no mundo
Estamos vivendo a era do egoísmo social
precisamos reaprender a viver
senão ...em breve ...
não sei... somente imagino o que acontecerá!
Nossos filhos...
Nossos netos...
Bisnetos...
Que falta de perspectiva de vida!
Que falta de vida!
Vida!
Vida!
Vida!
Que pulsa forte e sem parar
Basta olhar,
fazer e se permitir existir com o outro.
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