Reflexos

O destino bateu na porta. Joana não quis abri-la. Talvez tenha sentido medo ou insegurança, ainda que sejam quase a mesma coisa. Algo a fez voltar ao seu costumeiro e seguro lugar preferido: seu quarto. Uma repulsa a fez se contorcer ao tentar abrir a porta. Ela não foi insistente. Voltou à escadaria que conduzia ao andar de cima em passos largos e os 16 degraus da escada tornaram-se 5 ou 6.

Lá, da janela, suspirou vendo seu destino marcado voltando de costas para a rua e rumando para outra direção. Naquele momento, ela se sentiu satisfeita e o incômodo já não era tão forte como perto da porta minutos antes.

O destino tinha uma cara triste, melancólica, como de alguém que veio fazer o bem e é rejeitado. Uma cara piedosa, aquela que mudaria o caminho se ouvisse um barulho de arrependimento e redenção qualquer. E tudo parecia bom para Joana e o inferno para o destino que veio trazer o céu.

Joana sentou vagarosamente e pegou seu livro preferido, mas já não conseguia se concentrar. O incômodo havia voltado, mas dessa vez era um sentimento de insatisfação.

Quanta humilhação fez Joana com seu destino, oh Terra. Quanta desdenha pensou ela que cometera com alguém que deveria ser recebido com um artifício de fogo a fim de iluminar todo o ambiente e comemorar. Quanta crueldade e difamação para com ele, o destino.

O destino é um espelho, pensou, anos depois, Joana. Ele voltou pela janela, mas somente se fazia presente enquanto não olhado diretamente. Ele voltou para mostrar que Joana, anos atrás, humilhou-o, rejeitando-o. E o calafrio dessa vez era mais forte que o da porta no episódio da busca.

Joana se sentiu inútil, incapaz de escancarar uma porta e dizer que está pronta, mesmo não estando.

Joana morreu, por fim, como todo mundo morre. Não se sabe se a morte foi horrenda ou se foi típica. Mas morreu e, com ela, o destino não vivido, trocado por quatro paredes que eram trancadas pela janela e pela porta da qual fazia Joana não sentir medo. O destino de Joana morreu com ela, mas o destino morre para ir atrás de alguém que abra a porta e festeje a sua vinda.

Joana morreu. Dentro do quarto.

O destino viveu em outro corpo e fez outra história. Não importa se feliz, mas fez. Tudo por uma porta aberta e uma coragem medonha. O destino não é um para todos, mas todos são um destino e disso, Joana era sabida.

O destino de Joana foi rejeitado, mas viveu.

Joana morreu. Dentro do quarto.

Alexandre Ferraz