Outra vez

Permaneço deste lado do portão, com a mão esquerda levemente levantada para o abrir. Tenho as mãos bastante diminutas outra vez. Outra vez. As mãos pequenas no portão preto. Naquele portão que um dia foi de um azul que floria o silêncio e eu mesma o pintei de preto naquelas tardes que faziam quase pesar os dias. Entro em casa. hoje. Ainda está de dia. Se fecho os olhos. Casualmente. Desatam-se as marcas e durmo nos bolsos das calças de uma criança. Naquele tempo. Recordo-me. Aquele cachorro era do meu tamanho. E latia pela via pública como novelos que se desfaziam. Desastrados. Pensei nisto. Se fecho os olhos. Escuto tudo. Na tristeza debruada das frutas por sobre a mesa de minha mãe. Do ruído aniquilado e destruído das mulheres deitadas sobre a claridade. E posteriormente eu sou o meu corpo que se debruça de tronco alvo. E posso assentar-me na cama. E de olhos fechados sulco imediatamente os lençóis desfeitos para trás e sou um corpo em rocha calado, intrincado no frio murado daquele latir. Tão longe, tão longe no firmamento circular da limpidez. Se fecho os olhos. Se fecho os olhos. Percebo quando de manhã me levanto de sobressalto e ainda permanece de dia. Se fecho os olhos possuo os olhos cerrados. E percebo aquele portão. O único portão. Derribado e brilhante. Nas minhas mãos. Que se agitam sem pressa. Na eternidade.

Tatiane Gorska
Enviado por Tatiane Gorska em 01/05/2009
Código do texto: T1569196
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