SAUDADES DA LAGOA

SAUDADES DA LAGOA

O final de ano se aproximava, e com ele, o espetáculo dos ypês amarelos.

Eles se vestiam, se transformavam em dourado e só então, davam início ao espetáculo. Suas flores diáfanas planavam docemente num balé de sonhos e cor. E, caiam tão docemente que mal tocavam o chão, formando um extenso tapete amarelo-ouro.

E, eu corria, corria no afã de pegar uma, duas, centenas de flores e repetia a dança delas, naquela corrida. E, me inebriava com seu perfume...Passados alguns dias, como num passe de mágica, tudo acabava...as flores, a dança, eu.

Perto dalí, estava meu pé de tamarindo...e, era enorme, imponente, indestrutível. Sua copa imensa protegia minhas bonecas, expostas no chão. Suas folhas pequenas, frágeis, contrastavam com seu porte de gigante, e, balançavam ao sabor do vento. Do chão exalava um cheiro àcido dos frutos caídos, esmagados. E, eu me arriscava em lambe-los. E, era tão bom, eu era parte viva da lagoa. Um dia, meu tamarindo, de velho, tombou, repentinamente me vi sem ele, o protetor de minhas eternas brincadeiras. Minha/sua sombra, já não mais existia. Foi meu primeiro contato com a morte...começava desde já, a compreender a fragilidade da vida.

Decorridas décadas, volto à lagoa. Transeuntes passando num frenezi de idas e vindas, sobem e descem dos ônibus, gritam, se agitam, numa enorme babel. Mas, felismente é tempo de oitís. E, a despeito de tudo e de todos, os oitizeiros estão fartos de frutos esparramando-os pelo gramado. Seu cheiro forte me remete à infância povoada de cores, sabores e, liberdade. O passado se faz presente, ignoro os passantes, recolho uma fruta gorda, dourada, e, como...seu sabor é forte e travoso, e logo tudo me vem como em um celulóide, minhas brincadeiras, meu pé de tamarindo, meus bambús cantantes.

Onde o sossego de minha lagoa, onde os pássaros, onde o som das águas da fonte. Onde se perdeu tudo isso, ou fui eu que me perdí?