CIDADE
Gostaria de morar numa cidade onde houvesse vida intelectual: museus, oficinas literárias, lançamentos de livros, palestras de escritores... Uma cidade que pusesse minha cabeça para funcionar. Todavia, não queria uma cidade grande. Queria uma cidade pequena, rodeada de montanhas, bem arborizada, com uma praça, um coreto e uma grande igreja. Nas tardes de domingo uma orquestra sinfônica para alegrar a praça.
Gostaria de morar numa rua onde conhecesse todos os vizinhos. Que não precisasse anunciar visitas. Que repartíssemos o pão de queijo e todos os nossos problemas. Se precisasse de ovos para fazer o bolo e não os tivesse, diria: - “Vizinha, por favor, empresta-me ovos, assim que puder os devolverei”.
Gostaria de conhecer as famílias que fizeram essa cidade: os nossos antepassados, o padre - aquele que batizou todos, que casou muitos e encomendou um tanto... Aquele padre que dá aulas de português, francês... Ele teria sempre um lugar de honra na minha casa.
Não dispensaria nunca um clube onde, nos fins de semana, as famílias se reuniriam. Cada família numa mesa e os rapazes em pé, flertando com as moças que seriam seus pares. Ao som de boleros e valsas dançariam com amor e emoção de rostos colados.
Uma cidade tranqüila onde, nas tardes de domingo, pudesse passear de bicicleta com amigos sem se preocupar com o trânsito. Pela manhã, iria, com o melhor sapato, a roupa mais bonita, à missa das dez, onde encontraria as amigas para passear no “largo”, a fim de namorar.
Gostaria de morar numa cidade onde se comemorasse a Semana Santa. Iria a “Procissão do Encontro”, ao “Lava Pés”, levaria flores para o “Senhor Morto” e ouviria o sermão do padre na Procissão do Enterro.
Gostaria de acordar com o cantar do galo, numa casa onde pudesse acolher gato, cachorro, ter um grande quintal com galinheiro, farto pomar e jardim. E, nas tardes de verão, sentar-me-ia na porta da rua para conversar com as vizinhas – jogar conversa fora. A tarde fresca, amena, com crianças brincando na rua, andando de velocípede, bicicleta, correndo, trazendo alegria e paz. A tranqüilidade e a paz que uma cidade grande não oferece.