BEBER O ENTARDECER
A lua coloca a cara atrás da montanha e ilumina toda a barragem com uma faixa branca transparente. Ela não dorme. O barulho dos grilos, a algazarra das cigarras, o piar das corujas, são cantigas para a lua.
Os meninos, nas bicicletas, fazem piruetas de circo, correm adoidados ao redor da casa; e, os quatros bassets, latindo atrás. Enfim, tudo é festa.
Os bassets são negros, azeviche, com o pelo aveludado. Cachorro não tem preconceito. No sítio vizinho, uma cadelinha branca, peluda, dessas bem frescas, namora meu negrinho numa boa. É lindo!
O caseiro gosta de cantar musica sertaneja. E como canta! Só que o serviço não vai ao ritmo da música. Ele canta mais do que trabalha.
Pintei um Cristo na capela feita em pedras ao redor de três palmeiras imperiais. Pintei no tronco da palmeira, pois minha capela não tem teto. Disseram: - “Onde já se viu capela sem teto”?! Respondi: - “É para falar diretamente com Deus, sem obstáculos”.
O entardecer no sítio é um presente de Deus. Aos poucos, bem devagar, tudo, a natureza inteira vai ficando rosa: as montanhas, as árvores, a água do lago, o céu... E, aquele rosa, aos poucos, vai avermelhando. Parece que Deus vai jogando cores aqui... ali... e, esse momento, que não e longo, veste-se de um doce mistério. Os pássaros gorjeiam mais baixo, o silêncio percorre a tarde inteira e, a sensação que se tem, é de que, por um momento, o mundo pára.
E eu, bebo essa tarde; sorvo aos goles, saboreando cada instante. E, quando o sol se põe, atrás da bela montanha, sinto- me completamente embriagada por este presente de Deus.