VIAJAR E NÃO VIAJAR
Escrevi vários poemas com o motivo da viagem sendo o centro das atenções e até em alguns casos deixando nos versos a ampla hipótese de fuga para que o interlocutor também participasse da viagem pelos versos ou pela dinâmica do próprio texto, quando não poético ou negada essa sua condição pelo intérprete da hora.
E cada um que lê o faz à sua maneira, as interpretações da viagem, seja ela qual for, vão muito além de algum destino físico, de um sonho delirante ou de uma complexa metáfora. Até a viagem no sentido da razão afastada pelo uso do tal entorpecente ou a viagem de volta , que quase ninguém quer fazer, a não ser que se tenha batido às portas de um dos círculos do ambiente imaginado na comédia de Dante - que pode ser divino no viés literário - mas indesejado como paradeiro ou destino para uma alma singular, de cidadão comum nascido ao sul da linha do equador.
Entre viajar e não viajar, aos modos variados que as letras propiciam, cá estou em mais um carregamento de bagagens, com o peso do fardo às costas , tal a mochila que carregava na juventude, sobretudo no movimento de vai-e-vem da faculdade para casa e vice-versa , mochila que hoje só viaja pelos caminhos dos sonhos e das recordações.
Num desses episódios de viagem ao passado, acompanhado de um parceiro dos anos rebeldes, pegamos carona num caminhão do Exército para passar uns dias em nossas casas graças a um feriadão que deu trégua às aulas da faculdade de Direito. Nada demais embarcar no compartimento de carga do caminhão militar, não fosse o detalhe da dupla de caroneiros barbudos – estilo revolucionários - em plena ditadura militar e a cruel idéia que no meio da viagem meu parceiro teve, quando resolveu ler um tablóide comunista sob a cortina de fumaça de um “baseado” . Foram momentos de tortura para mim que no desespero, cheguei a pensar em saltar da viatura verde oliva. “ Não te assusta cara, é só uma viagem ...”