Aberto às formas

Simplesmente não podia percorrer com claridade aquele destino, na casa do sol as formas eram rítmicas e cada momento tinha seu ritual, a miúdo muito distinto e mesmo diria que abrasador. Mas ele não estava preparado para percorrer aquela magia, nova, poderosa, mas também indiferente o seu eu apegado ao antigo.

- Se houvesses nascido aqui, uma gota de chuva no teu rosto significaria a vida.

- Mas eu nasci no Norte, onde a água da chuva tem o significado do continuo.

Não podia acreditar então que cada grão de trigo era repartido como ouro que depende dos Deuses e o seu capricho, assim que quando oravam ao trovão ele lembrava-se do tempo em que era preciso resguardar-se da sua ira. Eles dançavam ante a iminente torrente que descia com brusquidão e fúria, e contemplava esse espetáculo como uma maravilha, enquanto as mulheres da sua terra se resguardavam no lume, estas moças bailavam molhando seu corpo em delírios de jubilo, porque a água aqui não trazia a umidade ao gelo aderida.

- Tens os olhos mais lindos do mundo

Simplesmente um grande sorriso, ela baixo a chuva, seu olhos cintilantes, o cabelo ainda mais negro como nunca tinha acordado nos rostos das mulheres de que ele memória tinha, e esta imagem da beleza era a vez tão distinta: nessa silhueta insinuante onde todo o mundo se refletia, mais alegre que a paixão que todo seu corpo a um saque movia dorido e raivoso; invalido e invalidado por tal excesso que lhe queimava as tripas.

- Se não te beijo, morrerei ira

E ela ria, ria com tanta sensualidade como um zunir violento e aromático, que cativamente o retinha, prendando de cada volume voluptuoso da sua cadeira, da sua cintura.

- Mais um beijo ou não resisto.

E era da cor da terra, era de contorno livre e pele suave. E ele calado, porque em seu lugar da nascença se inicia aprendizagem em rituais fechados, ausentes de luz no inverno dorido.

- Tens os olhos mais lindos do mundo

- Dança, comigo, comigo dança… dança, por favor, não fiques por ai parado.

Era explosão da exuberância, tambores ao perto retumbam e agradam nos secos os golpes, no ritmo cambiante, à esquerda e direita, em circulo, meio circulo com as pernas que entrelaçam e os braços se abrem: sobem, baixam, imploram ao céu, agradecem imitando assas de liberdade, o fragor da água.

Como poderia ele dançar, sonhando com corpo dela, a esse seu corpo colado; numa insinuação da sua boca, num piscar de pestanas em riso voando; ele acordou na sua coxa vibrando saudoso, com ela na frente dela sentindo saudades. Estava a dançar, com seu nariz perfeito parecia estava respirando, de tanto intercambio.

- Move-te, deixa-te levar, voa comigo alem das nuvens que passam.

Seu corpo molhado ele tão tosco para tocar-lho. Seus seios doridos, duros e perfilhados acima do peito dele ofegante e intimidado, tão no desarranjo, ela porem tão tenra deitando suaves caricias sobre suas atrapalhadas palavras. Ele tentando falar, ela elevando-lhe a mão para que não fala-se. Ambos a deitar um olhar sobre estes momentos da graça, onde os Deuses nos deixam voar, não importando, nunca importando a procedência das raças.

- Não digas… eu desde sempre te escuto.

Então lembrou-se da primeira vez que a viu, do primeiro dia que compartilharam a alegria do ser, surgindo por cima de espírito do estar que de forma tão monótona se adapta e aproxima das coisas. O ser ao lado do rio, o ser no prado acima da tolha pela fortuna deitada, e manteiga compartilhada ao igual que pão e salada, no ser ambos um só coração em dous peitos latejando.

Soube desde aquela estava decido: o riso dela serem dele, a ponta de seus dedos na palma da sua mão para sempre resguardados, como presentes enigmas que não interessa deciframos porque os vivemos assim como toda naturalidade. Soube ele que cada beijo dela ficava registrado na bondade de tornar-se belo por dentro da alma. E amar a vida, e amarem-se amando tudo quanto os rodeava. Soube ele que a partires de aquele dia surgiria de forma segura e irremediável um cambio de pele, uma mudança na carne lenta e prolongada como inicio do novo ser que de compaixão e fé, no aquém é edificado.

- Te quero

- Sei-o bem

- Te quis desde o primeiro momento em que te vi linda mulher que me evocas um tempo onde tudo for instável e a vez sagrado.

Assim a quis. Assim ela decidiu sujeitar sua mão e pelas ruas muito sujas, lama nos descalços pés, lama acima do tronco nu e a barriga deliciada também; ela como lama, o cabelo de lama a decidir seguir assim de mãos dadas pelo caminho da chuva, pelo carreiro da trovoada ate a cima do escuro onde seus corpos se juntaram, demoradamente lábio a lábio, por si mesmos devorados.

A seguir não houve mais palavras.

Quando a chuva rematou já estavam os dois a viver na mesa casa. Fora assim de fácil. Em certas alturas mesmo a vida não precisa de facetas complicadas