Poema ao Pai
À você, que raramente escrevi
e que agora só lê os meus pensamentos,
jaz fragilizado em leito de morte,
indefeso como criança recém-nascida.
A vida é curta, mas o caminho é longo
para a eternidade, que se aproxima.
Os momentos que lhe restam,
escapam pelos seus dedos cansados,
ansiosos por outra mão
para lhe conduzir por novos caminhos.
Os olhos ainda vazam luz,
na última fronteira da esperança.
Mas estão opacos, vítreos,
suplicantes de algo
que não se consegue perceber,
se é de um desejo louco pela vida
ou do desespero da despedida
que não se finaliza.
Trêmulos de emoção oculta,
movem-se titubeantes, tênuamente,
enquanto uma lágrima escorre,
vagarosamente.
Quem vive, mal suspeita
como pode ser difícil e penosa
a última etapa da existência.
O rosto transfigurado
pela luta de cada momento,
revela ainda assim
profunda dignidade.
Seu maior conforto
é a consciência do dever cumprido.
Pai, despeço-me agora,
descansa finalmente,
preparemo-nos para brevemente
um novo encontro
em outra dimensão.
Brasília, 17 de agosto de 2003
Em memória de Luiz Pellizzaro (19/04/1917 - 17/08/2003)