Dissolução
Mas ele deixou-me sentada e só, onde disse que estaria. A cada movimento dos ponteiros do relógio era atingida por minha insignificância. Havia visto as pessoas que felizes passavam ao redor de mim, e cogitei remotamente a possibilidade de falar-lhes, apenas para ter alguma companhia. E, no entanto, não me importava outra companhia uma vez que o esperava. Jamais o deixaria sem notícias, pois o prezo e não lhe causaria aflição ou mágoa deliberadamente. Ao passo que a ele, eu não parecia ter importância. Era possível abrir mão de mim em qualquer tempo, sem aviso prévio ou posterior. O mundo girava tranquilamente a sua volta incessante comigo irremediavelmente presa em sua rotação e distante dos outros seres. Parecia um castigo por amá-los. Jogavam-me de volta ao abismo oco do qual viera.
Um silêncio sepulcral jazia entre mim e os ruídos urbanos. Não importava mais nada - talvez fosse justamente o seu objetivo, tirar de mim as perspectivas e lançar-me na vastidão do não sentido. Era duro perceber que o mundo não significava, que eu não significava. Sopravam sobre mim com um baque a indiferença de minha existência. Arrancavam de mim a crença na necessidade de outros e da convivência e dos laços. Eu ligava-me às sombras daqueles a quem me desnudava. Restar-me-iam a solidão vazia, o monólogo sem eco, imagens desfocadas e sem nexo. Eu passaria pelo mundo sem deixar vestígios além da vaga lembrança de que alguém, um dia, tentou tornar as coisas reais de algum modo.