[Rastros de Sonhos]

[O labirinto do mundo]

Às vezes, para perder-me, eu nem gasto muito caminhar; parado, sem sair do lugar, remexo fundo em meus passados, e me perco em mim mesmo!

Sem deitar fora o meu farnel, desfaço por outras vias o caminho já trilhado, e por não querer repisar feridas, apago os meus rastros para não mais saber voltar!

Era do alto, bem alto, que eu me sobrevoava... eu era um ponto numa invernada, eu via os ramos do assa-peixe ondulando ao vento, eu via o gado espalhado na vazante, via o cachorro campeiro trotando macio, macio, ao lado de um cavaleiro cavalgando no ar, via o carro de boi afrontando a subida do morro sem jamais chegar ao topo, por mais que o carreiro gritasse; eu era candeeiro dos bois, e assistia a tudo, lá do alto...

Cansado, insone, eu me revolvia feito cobra mal matada; para tentar compreender a paisagem, roubei um esforço de mim mesmo, tentei, mas não pude abrir os olhos: via tudo claramente, com sofridos olhos interiores — quais? — descompreendi o lugar, as fainas, o tempo...

Mas pelas falas dos homens conversando à sombra do pé de angá, vi que tudo aquilo se dava em Minas, sim, era o mundo de Minas percorrendo-me aqui, no longe sem volta do meu desterro; desterro nem sempre é escolha!

De repente, ouvi gritos abafados, dizeres em língua estranha, de uma voz saída de um baú, ou de um labirinto; parei, apurei os ouvidos, tentei identificar quem gritava; não tive muito trabalho, pois o grito veio mesmo foi de dentro de mim: veio do labirinto do meu mundo!

E a paisagem de Minas continuou, como um filme, a desfilar visões ante os meus olhos que sofrem, pois veem o estrume do Passado...

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[Penas do Desterro, 12 de dezembro de 2008]