atrações

Naquele momento, de dentro de alguma fibra rota do peito, alguns anseios começam a brotar algo imperceptíveis. Logo, por afinidade, vão se misturando ao vazio frio do estômago. Aí começa uma reação química que torna os capilares desassossegados e muito quentes, suscitando uma atração forte e enigmática por outro corpo, mas não qualquer outro. Para que haja este fenômeno, porém, é fundamental que duas subjetividades se encontrem na interseção de alguns pensamentos confusos, aos quais não se é possível aplicar prescrição, e que essas almas se compreendam de algum estranho modo, sem saber porque. É essencial não saber porque. Quando isso acontece, pronto, uma pulsão de vida começa a germinar inexplicavelmente na ausência de luz, identificada por uma sensação de euforia que vai ganhando primeiro seus glóbulos vermelhos e depois se espalha pelas suas vísceras, percorrendo um longo caminho que vai dar na epiderme. Isso causa um estímulo nos pelos, que passam a fremir sem parar (chamam isso de arrepio), denunciando sua agora indisfarçável desorientação. Não muito tempo depois, e antes que você atine, seus olhos vão ficando sanguíneos, dando a dica àquele corpo que anda perdido pelo mundo, passando pelo mesmo fenômeno. E assim, como se na vida houvesse lógica ou magia, o outro te encontra numa dessas esquinas de fábula, quando menos se espera. Ele te percebe de longe. Acena. E acredita vivamente numa coincidência feliz. Mas quando ele avança, aí é que a festa interior começa mesmo. Primeiro tímida, como no primeiro baile, como no primeiro beijo. Logo mais, efusiva, vai ganhando seus nervos dorsais, braços e lábios, culminando num avermelhar de bochechas. Ridículo, não? Sim, um tanto. Aí as mãos se contraem em nervosas sudoreses; os dedos vão se unindo às palmas das mãos comovidas e suplicam mudos algo como um abraço, um gesto singelo e fraternal que naquele momento sui generis no qual você se encontra tem o peso de uma dessas aparições planetárias. Coisa rara. Esse acontecimento tornará sua vida coloridíssima ainda que por alguns minutos, trazendo de volta aquela antiga fé para acender seus olhos de estanho. Contagia sim. Como o efeito doce e analgésico de uma droga sintética. Abre janelas com visões azuladas em paredes de algodão e perfuma o ar de alecrim. Mas passa rápido, num susto. Depois, você já refeito, sai por um lado, o outro vai pelo caminho direito e os dois somem em meio aos estilhaços do dia. É, a maldita certeza do dia. No fim das contas é como se aquele acontecimento embora mágico e um tanto terapêutico para a seiva bruta do corpo, não passasse de um breve e comum encontro casual de dois conhecidos no meio da rua. Numa rua qualquer.

Jan Morais
Enviado por Jan Morais em 04/04/2006
Reeditado em 18/07/2006
Código do texto: T133589