Ainda não amanheceu
Dia que não amanhece,
pássaros não cantam, mas a luz nasceu leve e tímida,
arrastando raios dourados num lusco-fusco sem canção.
Crianças não brincam de inocente viajante,
porque não nasceu o dia esperado,
encharcado de horas anciãs fadadas ao passado,
que se projetam, cerceando os sonhos do porvir.
Portas há sem saídas nem entradas,
paisagem muda,
de castigo a natureza não chora nem ri,
não avança nem para, espera, apenas e tão somente espera.
Mas, o que?
Casamento de tom e ritmo.
Alegria e graça. Desejo e ação.
Fé e bravura, para entoarem juntas,
humanidade e natureza a melodia da vida.
Não é verão nem inverno, pois não amanheceu.
Não é primavera nem outono,
flores não acordaram e folhas não secaram.
Ilhas borbulham isoladas dentro de cada coração,
que anseia pelo prazer matutino consagrado.
Não há palavras nem ventania,
gestos ou orvalho,
tudo é calmaria
indiferente,
enquanto não amanhece o sorriso diurno que clareia semblantes de luz.
As fêmeas temem parir rebentos com lágrimas secas,
por saberem sorrisos escondidos nos prantos.
Sem amanhecer, onde os Mistérios e os sonhos,
sem os quais, onde o amanhã?
Mas há neste instante
um dia encubado,
enchendo o ventre das nuvens esperançadas de uma longa espera,
que será tão eterna e infinita quanto a solitude que floresce no
Palácio Celeste.
Santos-SP-04/04/2006