CONTO INACABADO

Para Marieva, sempre.

Maria, disse você ao telefone e eu do lado de cá da linha, do aparelho, do mundo, senti um aconchego n'alma, calor de gatinho pousando no coração, macio, redondo.

Maria, eu disse, agora sabendo que você me ouvia, não mais o "Maria!" de quando te chamo em pensamento e apenas eu ouço o eco de minha voz monótona no dizer teu nome.

Como sempre acontece, entre teu nome e as outras palavras que circulam pelo mundo, senti vertigem: o silêncio.

Reconheceste meu acanhamento e foste dizendo o que te deu proveito, prazer, que na fala me avantajas. Eu fiquei alheado, como sempre que te sei perto. Senti tua atmosfera, de país outro, longínquo e branco, e teu cheiro, que de cada vez parece de menina, de mato, de ribeiro que carrega sombras de coisas que nem sei lhes dizer o nome, de tantas e tão fundas. Não sei se lhe saberás o nome, ou sequer lhe reconheces a presença. Vá lá, são coisas que só percebe quem te ouve a voz e sente o teu perfume.

Quis outra vez adormecer ao lado da tua voz. Minhas palavras tentavam segurar o impalpável de tua presença, os olhos procurando no vazio refazer tua imagem e já sabendo-a etérea, efêmera, insuficiente. Desnecessária a minha fala, inútil. Gesto de náufrago pretendendo abraçar a penumbra, o reflexo da lua, o movimento d'água.

De novo o ar, o oceano, a terra, a distância. O medo do não mais. Medo de outros olhos em você, outros ouvidos para tua voz, tua maciez em outro peito.