MEDIDA DO TEMPO

Não sei se é bom ou ruim essa consciência que tenho da marcha cronológica do tempo. Marcha que não me assusta, pelo contrário, me faz pensar no muito que ficou para trás em meio à poeira da estrada.

Não sei se é a música que ouço ou o céu que vejo distante e muito azul; se o cantar dos pássaros no meu quintal amplo e verde; ou a beleza destes dias primaveris, que me fazem empunhar, sofregamente, a pena e transferir para uma folha de papel tudo o que sinto neste instante.

E, como me faz bem tornar, em pensamento, ao passado mais distante e de lá vir, devagarinho, até me encontrar aqui, com a caneta em punho, num melancólico adeus às minhas fantasias, duramente atingidas ou rasgadas pelo tempo.

Essa consciência da limitação temporal da vida é que me dá força e me faz amar mais e mais o passado, que é quase tudo para mim. Daí a pressa que tenho em viver, intensamente, cada minuto, cada hora, cada dia, certo do valor que o tempo tem para mim nos meus sessenta e quatro anos. Daí me perguntar: Por que permanecer aqui, preso à rotina diária, ator e espectador obrigatório de minha própria comédia?!

Detesto pensar que poderá a morte surpreender-me no leito ou no sofá... Prefiro as margens dos rios, a sombra das árvores, os dias claros e ensolarados... Morrer assim sozinho talvez, sem colo para me deitar, sem mãos para me acariciar, sem ninguém para amparar-me na queda... Simplesmente morrer, como morre o grito que não sai da garganta ou que se perde no longo espaço vazio...

Setembro de 1986.