João Vira-lata

Foi em 1962. Eu era foguista dos trens da Cia Mogiana e viajava semanalmente para Guaxupé, uma das pérolas das cidades de Minas Gerais.

Durante o meu repouso eu ia até o centro da cidade e conversava muito com as pessoas de lá. Certa vez, ouvi um senhor, que naquela época deveria ter uns 65 anos, contar um “causo”.

Dizia ele que na cidade em que ele morava quando moço havia um menino de uns 9 anos, que por ter apanhado umas tampinhas de cerveja no lixo de um bar, para jogar bolinha de vidro com outros garotos, ficara com o apelido de vira-lata. Esse apelido o perseguia pela vida afora, mesmo ele pedindo a todos para esquecer esse nome, nunca tendo sido atendido. Ele ficava muito triste com isso.

Eu me lembrando desse causo, fiz esta despretensiosa poesia.

João Vira-lata

I

Eu me chamo João Moreira

Caboclo de muito tutano

Sou sério. Não gosto de brincadeiras

E não me troco por qualquer fulano.

Mas nesta vida ingrata

De raiva fico espumando

É quando me chamam de Vira-lata.

II

Num povoado quase deserto

Fui criado com rédea curta

Pois entre o duvidoso e o certo

Quem respeita não insulta

Aos mais velhos sempre bem se trata

Mas o que mais me entristece,

Fico de raiva verde como cipreste

E quando me chamam de vira-lata

III

Casei, tenho família aumentando

Qualquer trabalho nunca me fez frente

Eu continuo lutando

Um dia ainda serei grande gente

Mas com desprezo alguns me tratam

Chamando-me de Vira-lata

IV

Já rodei um bocado

Morando por todo lado

Tive terra e rancho e três porteiras

Pode acreditar com certeza.

Mas o que me prendeu de tal maneira

Foi a bela Fortaleza.

O que neste mundo me maltrata

É ser chamado de Vira-lata.

Laércio
Enviado por Laércio em 10/11/2008
Código do texto: T1276740