Há muito tempo o natal não motivava.
Jamais acreditei em papai noel.
Nem quando criança.
Ao crescer fui aprendendo que há um natal para quem tem condições
de mesa farta, muitos presentes, familia reunida e festa.
Há um natal para os que mal têm onde morar.
Às vezes nem mesa têm.
E nem se fale em presentes ou festas.
Para alguns, nem há natal.
...
Esse seria um natal como tantos outros.
Risos fáceis, muito brilho, tudo cronometrado, ensaiado, repetido.
Quem lembra do aniversariante, parece recitar um texto nada improvisado.
Sem emoção.
Missão cumprida!
...
Esse seria um natal como tantos outros.
Sem emoção.
Não fosse ter resolvido dar um passeio.
A paisagem era bonita e muito tranquila.
Para a perfeição e época, talvez só faltasse a neve.
A rua deserta, luzes em quase todas as janelas.
Imaginei que todos estivessem comemorando.
As crianças ansiosas e também os adultos, embora não admitissem.
De vez em quando passava um carro, levando o papai noel a tocar sininhos.
Ou pessoas apressadas na visitação de familiares e amigos,
até chegarem na casa onde passariam a noite.
Caminhando sobre uma ponte, vi a mulher encostada na grade.
Olhava para cima, fixamente.
Bem vestida, bonita, uma dessas mulheres para quem o tempo não parece ter marcado o corpo,
nem a pele.
Eu me aproximei e cumprimentei.
A mulher virou-se e sorriu, sem nada dizer e voltou a olhar para o céu.
O sorriso era acolhedor e fiquei, tentando olhar na mesma direção
e descobrir para onde iam seus pensamentos.
Depois de algum tempo, foi ela quem me dirigiu a palavra.
- O que você gostaria de ganhar no natal?
- Nem pensei nisso - respondi, surpresa.
- Por que?
- Não gosto do natal...
- Eu também não gostava, até encontrar um homem que renovou em mim esse espírito.
- Você quer me contar essa história?
- Desde que eu possa continuar olhando o céu...
E começou a contar.
Ela tivera muitos amores. Nenhum deles vingou.
Lembrava-se de cada um, com carinho.
Casara, descasara, e nunca tivera filhos.
Bem sucedida profissional e financeiramente, benquista e admirada,
teve uma vida plácida, sem atropelos, medos, sustos ou carências.
Às vezes se flagrava triste e repreendia a si mesma, por não ter motivos.
Um dia conheceu um homem diferente de todos os que conhecera até então.
Era escritor e parecia conhecer todas as palavras do mundo e quando as proferia, soavam
com sentido pleno e total.
Em sua boca, a noite era mais noite e brilhava intensamente.
O sol aquecia docemente, sem machucar.
A lua tinha como mistério, sua capacidade única de viver e reviver.
Mágica, a lua ensinava, a cada ciclo, que reviver era possível.
Em suas palavras, tudo tinha perfume e os perfumes de nada serviam se não evocassem
idéias.
Terra com cheiro de chuva, chuva com cheiro de mel, mel com cheiro de alfazema,
alfazema com cheiro de banho, banho com cheiro de lar, lar com cheiro de céu...
Ele era cego e permitia-se enxergar o mundo de maneira muito mais plena do que qualquer
pessoa que pudesse ver.
Via muito além dos olhos.
A cegueira viera de uma doença que consumia sua vida física e o fazia renascer
de um outro modo, a cada dia.
Da amizade ao amor foi natural.
Nela ele amou a mulher, que enxergou ao seu modo.
E nele ela amou o homem que a ensinou a ser essa mulher.
Um dia ele avisou que o reinício estava próximo.
Para ele, morrer era reiniciar a vida.
De outro jeito.
Na terra que cheirava chuva com cheiro de mel e alfazema.
No banho com cheiro de lar.
No lar perfumado como o céu.
Prometeu que ali reapareceria, na noite de natal.
Brilharia como uma estrela, guardando um lugarzinho para ela, ao seu lado.
Esse era o presente desejado por aquela mulher.
Ele escolheu aquela data, para recriar nela o espírito do natal.
Ensinara que o natal não é nada do que detestávamos.
Natal é momento para sonhar e é o dia em que cada um acredita em seu melhor.
E o melhor é o que se compartilha.
E o melhor é sorrir em meio às lágrimas.
E o melhor é a esperança.
E o melhor é sim, o presente para quem nada tem.
E o melhor é a prece.
Entendendo o que ela procurava, olhei também.
E ambas vimos!
Um brilho suave e uma estrela surgindo.
Sorrimos para a estrela e sorrimos uma para a outra.
Era Natal!
06/11/2008
Jamais acreditei em papai noel.
Nem quando criança.
Ao crescer fui aprendendo que há um natal para quem tem condições
de mesa farta, muitos presentes, familia reunida e festa.
Há um natal para os que mal têm onde morar.
Às vezes nem mesa têm.
E nem se fale em presentes ou festas.
Para alguns, nem há natal.
...
Esse seria um natal como tantos outros.
Risos fáceis, muito brilho, tudo cronometrado, ensaiado, repetido.
Quem lembra do aniversariante, parece recitar um texto nada improvisado.
Sem emoção.
Missão cumprida!
...
Esse seria um natal como tantos outros.
Sem emoção.
Não fosse ter resolvido dar um passeio.
A paisagem era bonita e muito tranquila.
Para a perfeição e época, talvez só faltasse a neve.
A rua deserta, luzes em quase todas as janelas.
Imaginei que todos estivessem comemorando.
As crianças ansiosas e também os adultos, embora não admitissem.
De vez em quando passava um carro, levando o papai noel a tocar sininhos.
Ou pessoas apressadas na visitação de familiares e amigos,
até chegarem na casa onde passariam a noite.
Caminhando sobre uma ponte, vi a mulher encostada na grade.
Olhava para cima, fixamente.
Bem vestida, bonita, uma dessas mulheres para quem o tempo não parece ter marcado o corpo,
nem a pele.
Eu me aproximei e cumprimentei.
A mulher virou-se e sorriu, sem nada dizer e voltou a olhar para o céu.
O sorriso era acolhedor e fiquei, tentando olhar na mesma direção
e descobrir para onde iam seus pensamentos.
Depois de algum tempo, foi ela quem me dirigiu a palavra.
- O que você gostaria de ganhar no natal?
- Nem pensei nisso - respondi, surpresa.
- Por que?
- Não gosto do natal...
- Eu também não gostava, até encontrar um homem que renovou em mim esse espírito.
- Você quer me contar essa história?
- Desde que eu possa continuar olhando o céu...
E começou a contar.
Ela tivera muitos amores. Nenhum deles vingou.
Lembrava-se de cada um, com carinho.
Casara, descasara, e nunca tivera filhos.
Bem sucedida profissional e financeiramente, benquista e admirada,
teve uma vida plácida, sem atropelos, medos, sustos ou carências.
Às vezes se flagrava triste e repreendia a si mesma, por não ter motivos.
Um dia conheceu um homem diferente de todos os que conhecera até então.
Era escritor e parecia conhecer todas as palavras do mundo e quando as proferia, soavam
com sentido pleno e total.
Em sua boca, a noite era mais noite e brilhava intensamente.
O sol aquecia docemente, sem machucar.
A lua tinha como mistério, sua capacidade única de viver e reviver.
Mágica, a lua ensinava, a cada ciclo, que reviver era possível.
Em suas palavras, tudo tinha perfume e os perfumes de nada serviam se não evocassem
idéias.
Terra com cheiro de chuva, chuva com cheiro de mel, mel com cheiro de alfazema,
alfazema com cheiro de banho, banho com cheiro de lar, lar com cheiro de céu...
Ele era cego e permitia-se enxergar o mundo de maneira muito mais plena do que qualquer
pessoa que pudesse ver.
Via muito além dos olhos.
A cegueira viera de uma doença que consumia sua vida física e o fazia renascer
de um outro modo, a cada dia.
Da amizade ao amor foi natural.
Nela ele amou a mulher, que enxergou ao seu modo.
E nele ela amou o homem que a ensinou a ser essa mulher.
Um dia ele avisou que o reinício estava próximo.
Para ele, morrer era reiniciar a vida.
De outro jeito.
Na terra que cheirava chuva com cheiro de mel e alfazema.
No banho com cheiro de lar.
No lar perfumado como o céu.
Prometeu que ali reapareceria, na noite de natal.
Brilharia como uma estrela, guardando um lugarzinho para ela, ao seu lado.
Esse era o presente desejado por aquela mulher.
Ele escolheu aquela data, para recriar nela o espírito do natal.
Ensinara que o natal não é nada do que detestávamos.
Natal é momento para sonhar e é o dia em que cada um acredita em seu melhor.
E o melhor é o que se compartilha.
E o melhor é sorrir em meio às lágrimas.
E o melhor é a esperança.
E o melhor é sim, o presente para quem nada tem.
E o melhor é a prece.
Entendendo o que ela procurava, olhei também.
E ambas vimos!
Um brilho suave e uma estrela surgindo.
Sorrimos para a estrela e sorrimos uma para a outra.
Era Natal!
06/11/2008