Cinzas

O que restou enfim?

Sei que, embora inútil, ainda me resta a transparência da lucidez.

Mas não me consola a luz que ilumina o pensamento.

A revolta é um sentimento impuro, um animal ingrato que morde com freqüência a mão que o alimenta.

Não pode haver perdão, onde jamais houve arrependimento.

Não há resignação, se a dor que ficou é impiedosa e pungente.

Não existe o conformismo, quando sequer foi dada oportunidade de defesa.

Não é possível submeter-se, se há revolta e mágoa aniquilando o coração.

Não há remédio que cure o corpo, quando a febre ardente consome a alma.

Sei também que, apesar de tudo, deve-se tirar de tudo o que restou algo de bom.

Afinal, não há nada tão ruim que dele nada se aproveite.

Mas na penumbra que envolve a inércia deste quarto, a visão turva de meus olhos submersos, não consegue ver o que de bom exista.

Não é possível enxergar um milímetro sequer, além da proeminente tromba atrevidamente instalada na ponta do nariz.

Tony
Enviado por Tony em 21/03/2006
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