FALAS, COISAS QUE SE QUEBRAM
E eu fiquei olhando sem ver, ouvindo sem ouvir, falando sem dizer, enquanto as janelas antigas desdobram seus vitrais, os pássaros suas asas no branco da Lua e a sua voz permanece na língua incompreensível daquele país no qual todas as falas são coisas que se quebram na minha fala.
O dia uma taça onde cabem todos os líqüidos, mas o corpo está seco como campo depois da queimada.
O travesseiro objeto estranho como a cabeça, os pensamentos vespas num jardim selvagem onde você não dorme nunca.
O telefone toca longínqüo, as asas quebradas de um pássaro, mas já não sei acordar o silêncio quando o telefone pára.
Os bêbados os loucos os poetas todos já se recolheram há muito às suas casas, mas algumas mulheres ainda esperam.
Quando você levou minha linguagem eu já era muda, mas não sabia que tudo era muito tarde desde a sua primeira vinda como uma tampa sobre as coisas que ferviam.
Nunca soube explodir. O fogo queimou tudo.
Olho o prédio explodindo para cima extraordinárias paredes onde havia uma casa. Adivinho formigas nos andaimes.
A casa povoada de objetos - não sei quando vieram - estão aqui como eu estou: passageiros estáticos.
Passo e não passo porque minha sombra é sempre a mesma.
Pudesse calar dentro o que escondo para fora, talvez alguma coisa conhecesse silêncio suficiente para começar a existir.
O silêncio nunca existe se o pensamos, mas já não consigo gritar para saber que existo.
Colhi o olhar do homem desesperado que me deu sua boca no quarto de hotel. A boca era macia, mas as palavras ocultas queimaram-me a garganta. Ele jamais disse nada da sua garganta queimada pelas palavras que eu não disse.
Seu corpo branco, a paisagem de seu rosto, quase inverno nos Alpes. Tudo se oculta no branco, tudo no negro e aprendi a andar não tendo olhos
nem ouvidos. O telefone é uma presença de outro mundo.
A neve queima.
Sei que houve um país um mundo que habitei. Eu era parte das pedras e dos líqüidos, das raízes e dos objetos construídos.Eu era eu fui não quis partir levaram-me.
Eu poderia passar todos os minutos da minha vida contando, um por um, os fios da sua barba.
O outro tinha longos cabelos, quase até a cintura. Às vezes eu lhe pedia que os soltasse e ele me chamava de turca, aquele homem antigo como uma escultura asteca.
Os países que ainda habito cortaram-me o nome ao meio.
Hoje batizam-me todos os dias, cada dia com um nome novo, por isso já não sei quando me chamam.
Os meus homens conhecem o silêncio.
Sonhei-me numa sala de concertos para dois violinos, um ao lado do outro.
Se vocês dois se tivessem fundido, um ser quase perfeito;eu não teria peregrinado tanto.
Se me tivesse fundido com elas, as vossas outras amadas, não sei o que eu teria sido mas Deus, certamente, existira mais próximo.
Todos, todas: uma mulher, um homem. O mundo em seu início, de novo.