Em Movimento

Esquecia-o apenas porque era preciso.

Não sabia exatamente por que o era, entretanto. Apenas que não esquecer causaria mais sofrimento.

É que a casa dele não tinha os elementos componentes de uma casa, pois ali não era seu lar.

Porque não havia raízes que o prendessem aonde ela estava. As raízes dele eram de outro espaço.

Escorregaria daqui como escorregara sobre a existência dela.

Ela, porém, não tinha raízes em espaço algum do mundo.

Flutuava como uma flor que é levada pelo vento.

Movia-se constantemente, quase com desespero de parar e descobrir o nojo no subterrâneo das construções humanas.

Era o esgoto fétido prestes a jorrar de um cano que estourasse.

E todos sorriam honrando a suposta beleza, fingindo não saber que o que era belo só havia em nome do que era feio.

Empurravam com repulsa para fora do mundo o que não lhes agradasse.

Ela não agradaria... não queria agradar...

Deixar-se levar pela brisa era a única maneira de não permanecer tempo suficiente para que descobrissem que não a queriam e a condenassem ao limbo, de preservar sua loucura das prisões e dos sanatórios.

Como louca, sabia que não o esqueceria. Não sabia esquecer-se das pessoas.

O vento, contudo, afagaria seu sofrimento pelas coisas do mundo.

Clarissa de Baumont
Enviado por Clarissa de Baumont em 30/10/2008
Reeditado em 30/10/2008
Código do texto: T1256784
Copyright © 2008. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.