[Desatino: Projeto do Nada]

Os meus olhos tentam decifrações,

buscam razões, semelhanças...

À luz do poste de iluminação,

o asfalto trincado da rua erma

parecia a pele de um porco

sapecado a fogo de palha...

De repente, a morte... como vou morrer?!

Eu, que tanto projeto coisas inúteis,

não seria melhor eu projetar a morte?

Ah, desatinos à mesa de um bar!

Por que deixar à conta do Acaso,

por que não roubar aos deuses

o prazer sarcástico da ceifa de mim?

Crio-me como se cria um porco:

— para ser morto pela mão do tempo!

Há coisas sobre as quais me calo;

o clamor de antigos silêncios

pesa sobre mim com o clangor

do ferro das montanhas de Minas;

razões e semelhanças... Ah, este desatino

vêm de lá, da Minas onde abri os olhos —

terra, terra minha — por que me lançaste

assim, nu, ao vento do desespero?

Um hausto profundo traga-me a voz;

assim, as palavras que a boca não grita,

escoam-me da pena — eu escrevo!

[Penas do Desterro, 12 de fevereiro de 1999]