Moldura dos Olhos
"Algures, aonde eu nunca viajei."
(E.E.Cummings)
Aqui, na mesma marginal do passado, falaste da véspera lavrada dos dias, os dias ínvios dos olhos distantes, não soubemos colher nos lábios as sílabas que ardem mais alto que as aves da inocência. Entreabertos os dedos num hábito de areia, descendo a pele na sombra frágil da noite e voltam ao corpo o traço das ondas. O que foste numa invenção quando disputo na colina do ar a sombra que desliza por ti. Ela cinde os véus nos ombros desnudos e o delírio ou os mastros no horizonte pendular. Ouço o quotidiano em árvores arqueadas ao vento, digiro o musgo do destino pelo fim das horas, não me prendo ao destino que não existe, confesso, viajo pelo espaço no sentido da paisagem que não virá, sem saber quais as veias correndo ao lado do futuro. Envio à memória um retrato do que flui, o passeio dos gestos oscilando pelos bolsos da vida. Sem mágoa, regresso à marginal com os lírios brancos da neblina. Quem lê, leia a respiração suspensa de um dia – a moldura dos olhos, a íris do que se não vê.