Foi um sonho, apenas um sonho...

 

 

Sonhei que estávamos de mãos dadas. Suas mãos estavam frias, não pude sentir o calor que sempre emanava delas. O calor que senti tantas vezes sem mesmo nos tocarmos. Não tínhamos o costume.

 

Seu corpo estava rijo como uma estátua de pedra. Fria, muito fria. Meu corpo  todo estremeceu.Foi como se a morte passasse por mim.

 

Eu dizia: levanta, vamos caminhar, vamos passear entre os eucaliptos. As vacas estão pastando, vamos sentir o cheiro que você tanto gostava, o cheiro do estrume renovador. Temos muito para conversar. Muitas histórias para contar, a vida para recuperar, a vida que você deixou, mas mesmo assim continuou.

 

A velha na varanda tecia e a trama do tecido a sua vida revivia. O desenho parecia simples. Eu não conheço você, pensei, vendo como tudo transcorria.

 

Não sei por que os cães ladram a nossa passagem. Pensava naqueles tempos que a vida fosse só amor.

 

Eu bem queria prendê-lo na trama do tecido de tiras simples para que não fugisse de mim. Não mais, nunca mais.

 

A velha tecelã desiste de tecer e eu desisto de você. Não impeço a despedida. Mas mesmo assim quero dar-lhe a mão. Sentir o seu calor. Quilômetros nos separam, mas não são quilômetros no espaço são quilômetros no tempo, quilômetros na eternidade.

 

O jazigo de mármore é branco com veios de sangue azul. Meu sangue é vermelho, herança que me deixou.Ferve fácil, muito fácil, como o seu quando irritado.

 

Há um abismo entre nós. Nem mesmo em sonhos eu posso mais lhe dar a mão. Ela se estende no ar e eu não consigo tocá-la.

 

A solidão é profunda. A noite agora está vazia. Perdi sua presença, só tenho a sua ausência e um coração partido sangrando em minha alma.

 

Ah, o desejo que tenho! Ah, o pedido que faço ao Deus dos acordados depois de um sonho tão triste: que eu me transforme em um pássaro, pairando bem alto no ar. Um pássaro que tudo observa, mas perdido o coração nunca mais há de sofrer.