Olhos silvestres

Olhos silvestres, selvagens, de um tom castanho-claro, misturado aos tons de mel, cor da terra, cor do encanto. Olhos de ternura. De um espanto fugaz e divino quando me olham atrevidos e, ao mesmo tempo, suaves. Diria que quase enlouquecem as minhas tardes lânguidas, esticadas nas cortinas do horizonte, espreguiçando-se diante do mar. Algo além da matéria, da matemática. Um feitiço. Milagre da natureza quase insana. Uma química perfeita de corpos e peles. Um olhar maduro como o pôr-do-sol, deitado nas bordas do céu. E nas janelas sempre abertas do meu peito, a luz do teu olhar preenche através das venezianas místicas e versos de amor que me lembram muito bem Rimbaud.

Oh, esse olhar silvestre. Quase profano. Insano até, eu diria... Como as noites cheias de estrelas. A lua vazia no céu. Flores frescas sobre a mesa. Teus retratos em preto e branco espalhados nas paredes em tons de lilás e rosa intenso, cor de volúpia. Perto de tua doce presença e olhar de menino, sinto-me como recém-chegada aos dezoito anos. Jovem, de cabelos cor de trigo, o rosto quase angelical, a boca de pêssego e os olhos muito vivos. Não há palavras para exprimir a meiguice, os velhos vícios, as juras promessas e todo o universo de sonhos que eu represento na tua ausência em um palco vazio, de longas cortinas rubras e perfume de outono.

Retrato teu nome dentro do vão das coisas nuas. Pudera eu, diante desse olhar que revigora entrar em tua alma e viajar dentro das tuas entranhas. Oh! Príncipe. O teu sorriso é tão belo quanto a plenitude das rosas, florescendo na relva úmida e calma de um dia perfeito como o andar dos teus passos. Passos de anjo, de um querubim, intenso, lascivo, quase perfeito. E esse teu olhar é um de profundo azul quando as cores dos dias mudam, conforme a hora e o lugar. E as estações sacodem-se inteiras nos trezentos e sessenta e cinco dias de um ano inteiro.

E o gosto dos teus beijos me lembra muito bem a primavera, perfeita, feita de delícias e de sonhos. E você é um doce desperdício e desde o início, na vastidão do teu olhar eu me perdi, sem saber para onde ir. No barco ébrio, não sei como remar neste vasto oceano de fantasias cravejadas de diamantes nos verões azuis debaixo de céus ultramarinos. Nos pergaminhos de tua estrada líquida, cheia de luz, você me conduz aos deleites, instantes mágicos de puro fascínio dentro do teu corpo quente como o enleio noctívago a arder insano e sem nenhum pudor.

Nos signos do olhar, tempestades em copo d água, nas asas de um anjo louco; eu posso sonhar sempre que você retorna ermo e cheio de nuances cor de cristal. No líquido fugaz, dentro da profundidade dos teus guardados secretos, da tua boca, a cantarolar os versos do amor, sem sentir dor, apenas estrelas em tua pele morena. Eu, cada vez mais, me perco e deixo que você me devore: selvagem, silvestre, como um gato manso, um anjo solitário, um amigo do peito, um amor para a vida inteira dentro de um único instante.

Verônica Partinski
Enviado por Verônica Partinski em 06/10/2008
Reeditado em 23/08/2009
Código do texto: T1213837
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