[Trajetórias: Vertigens!]

Distâncias... a vida só faz criar distâncias. Abate-me um tédio quase irremediável, e então, decido que devo partir, e parto. Ou separo. Ou corto. Ou dilacero o que não deveria ser dilacerado. Tomo distância do foco, do centro, da matriz, da nutriz antes tão desejada, agora, rota, perdidamente gasta! Afasto-me como se agora eu fora um ponto que se afasta da origem. Cruel comigo mesmo, necessariamente, inexoravelmente, afasto-me, deixo o porto!

É claro, falo do primeiro passo depois do cansaço, depois da perda de tudo, depois de pensar no que fazer com o vazio que ficou. Falo desse ponto de onde parti pensando num horizonte agora abandonado lá atrás, algo tão insondável como aquele ponto onde comecei desenhar a primeira letra de um texto extenso - e há sempre esse primeiro pontinho!

Depois, novamente o imponderável, depois a busca de um foco, de um centro, de uma matriz, uma nutriz de meus desejos que, neste instante, aparece colocada longe, bem longe, como o fim duma estrada a ser vencida. Mas depois, sei que haverá outra perda, outra fuga da dor, e outra partida - são os ciclos das trajetórias da vida!

Trajetórias: vertigens! Vertigem de perdas, vertigem de partir, vertigem de ficar, sim, vertigem de ficar falando sozinho, vertigem de ficar dançando sozinho até cair, vertigem... vertigem de acordar de um sonho intenso... vertigem da absurda efemeridade da vida. Vertigem de não mais se saber companheiro; vertigem de ser ácido, de ser corrosivo apesar de saber próximo o abismo fatal!

Vertigem, vertigem dos absurdos - tudo são vertigens nesta caminhada!

O tédio dá vertigem... O tédio se manifesta na distância de mim até mim, a mais imponderável e insuportável de todas as distâncias - a fuga do ser-com... do ser-para... - o nexo da solidão! Andar longe de mim é estar longe do que mais gosto, do que mais quero, e fazer do sonho apenas sonho, uma fumaça que se esvaece.

Não tenho a obrigação de ser conexo, mas sei que engendro sentidos. Geralmente, a regra forte é: tudo acaba mal! E andar longe de mim é jamais conseguir terminar bem terminado o que antes fora começado, seja lá o que for! É deixar a frase assim, no "ó"...

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[Penas do Desterro, 2 de outubro de 2008]