AGUARDE MINHA VISITA...

Havia serenidade naquele estranho comportamento. Conservava as poucas roupas que ele havia deixado - por esquecimento ou para simplesmente ser lembrado - no armário que usara por tantos anos. Não mudara a posição da mobília, conservara cortinas, tapetes e aromas. Apenas a poeira e as traças eram banidas.

Recusava convites e promessas de novos amores. Cercou-se apenas de si e do que restara dele...

Aguardava sua visita empenhando-se em não parecer especialmente vestida para o encontro... esforçava-se em disfarçar a necessidade visceral de tê-lo novamente por perto. Houve época em que o esperava nua, nudez calculada... deixava-se flagrar fingindo surpresa...mas ele não a tocava, desviando o olhar...

Desesperada, fez algumas promessas, pediu ao pai-de-santo ajuda para tê-lo de volta, amargou penitências e jejuns... purificações consideradas essenciais para ser merecedora de tal graça...

O tempo, remédio para a maioria dos males da alma, tratou de consolidar dentro de si aquela inexorável perda...

Sentindo-se finalmente derrotada e impotente, tomou a decisão que julgou ser a mais sensata, comunicando-a com voz firme:

- "Não aguento mais... fico aqui sem saber o dia em que você vai aparecer... isso não é justo...Escute bem o que vou lhe propor: de hoje em diante, aguarde você a minha visita..."

Assim, religiosamente, uma vez por mês, escolhe o melhor vestido, ajeita os cabelos, compra flores do campo e com olhar marejado visita seu túmulo...

Belinda Tiengo
Enviado por Belinda Tiengo em 20/09/2008
Reeditado em 20/09/2008
Código do texto: T1187914
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