Será que será
Não sei se penso quando, de dentro de mim, emerge um susto, uma memória de um qualquer lugar em que eu já estive, de uma qualquer pessoa em que eu já estive. Quantos lugares fui, quantas pessoas estive.
E, nesse lugar, a memória é sempre um susto, um medo de lembrar até voltar. Não sei se penso que volto. Melhor é ficar aqui. Melhor ser ninguém aqui até que da boca minha saia a palavra que me desenlace de mim, e essa palavra será o que serei.
O mundo vai perder o segredo por um instante; as coisas , de repente, estarão carregadas de sentido, de uma contração própria, de um pouso ameno de sua verdade sobre sua matéria, que a preencherá sem transbordar, respeitando a tensão superficial do entendimento dos homens. Alethea!
O sol que aquece os alambiques e faz dos capins mais secos, embora mais dourados, saberá de mim e eu serei entendedora de todo o seu processo. Decifrarei a profecia que ele vocifera qual alguém que aprende um idioma novo. A profecia à qual não se deve dar ouvidos, profecia do cansaço dos homens, de tão improfícuos que são seus esforços - e eu mesma profetizo.
E ficarei com aquele atraso que vem com a lucidez, que é o revés da epifania; com a face contemplativa, com o susto de me lembrar onde estou e receberei, já sem alarde, meu susto futuro. Onde serei, quem estarei. Profecia.
Fernanda Lobo