Moça

Na morgue sombria, aguardava, sombrio

Bernardo e seu traje ensangüentado

Pelo corpo que vinha, sem pulso e frio

Imóvel, de olhos fechados

Chegado o corpo, feminino, esguio

E a alva pele de manchas maculada

Fez Bernardo sentir um cruel calafrio

E no peito uma dolorosa fisgada

Entortou-se para trás, afônico e tonto

E apoiou-se em um móvel qualquer

Plantou em seu rosto uma expressão de espanto

Ao notar que conhecia a mulher

Procurou, ansioso por alguma identificação

Onde estaria marcada?

Não havia seu nome, ou qualquer marcação,

Ela apenas morrera, e mais nada

O cadáver passara por um tratamento anterior

Estando limpo com muito asseio

Tornando visível como um esplendor

Um grande orifício em seu seio

Não teve coragem de começar a examiná-la

Antes de conhecer sua identidade

Abriu com os dedos seus olhos, cor de opala

E viu em seu reflexo a verdade

A princípio, lembrou-se vagamente

Do tempo que ainda estudava

E então, em sua mente de repente

Surgiu a jovem que tanto amava

Os cabelos de cachos caindo

Por sobre os ombros tão finos

A boca rosada sorrindo

Encantando a todos os meninos

Lembrou-se dos dias imundos

Inteiros passados nos cantos

Olhando-a com seus olhos profundos

Agora desfeitos em prantos

Lembrou-se de como chorava

E cantava seu amor postergado

E de como se magoava

Por tão longamente ter-la amado

Arrependeu-se de não ter-la contado

Houvera a oportunidade uma vez

E chorou seu amor, mal amado:

Agora já era morta Inês.

Joao L Terrezo
Enviado por Joao L Terrezo em 17/07/2008
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