Pintura sedutora
Senti um desejo incontrolável de pintá-lo...
Infeliz a mulher que sou, talvez, mas feliz a artista tomada pelo desejo!
Abrasa-me a ambição de pintar aquele que me apareceu tão raramente, e tão cedo me fugiu, como foge um sonho na noite escura, quando acordamos subitamente.
Quisera pintá-lo em todas as suas nuances, retratá-lo belo, como realmente é: surpreendente belo. Nele predomina e ressalta o negro: e tudo o que ele inspira é noturno e profundo, por isso mesmo envolto em mistério, delicioso mistério que me encanta.
Seus olhos são duas estrelas, onde cintila vagamente a sedução, e seu olhar ilumina como o relâmpago: é uma explosão nas trevas.
Poderia compará-lo a um sol negro, se fosse possível conceber um astro negro aspergindo luz e felicidade.
Habitam-lhe na breve fronte a vontade tenaz e o amor pela vida, o soturno encantamento e o desejo que divide comigo, a emanar pelos poros, a me envolver feito laços, a me penetrar como espada...
Todavia, nesse rosto inquietante, onde narinas frementes aspiram o desconhecido e o impossível, rebenta, com inexprimível encanto, o riso de uma linda boca, sedutora e deliciosa, que faz pensar no milagre de um raio de luz a atingir o mais sombrio recanto.
Há homens que inspiram o desejo de vencê-los e amá-los, por toda a vida; este, porém, desperta o desejo de morrer lentamente, apenas sob o seu olhar...
Por todas essas e outras centenas de razões, quisera pintá-lo, para que seu encantamento continue a me dominar, para que eu o tenha comigo, mesmo que seja em uma tela fria, alegrando minha alma e me enchendo de esperança de tê-lo novamente comigo...