Vento

Um dia ela me disse:

Essa vida é muito curta

Os minutos são tão poucos

Vê se pára de brigar

A vida é tão pequena

Os segundos são tão quentes

Não há razão de resmungar!

Eu queria concordar

Queria enxergar assim

Queria ser menos preocupado

Queria ser menos de mim

Queria ter um pouco mais dela

E muito menos dessa ânsia que me aperta o peito

Que me embaralha as idéias

Que me dói cada pedaço

Que no fim não tem jeito

Ela queria que eu fosse diferente

Que parasse de implicar

Que gostasse dela com toda aquela poeira

Com todo aquele orvalho de coisa nova

Eu nunca quis encontrar a menina

Molhando os pés no açude sujo

Com as unhas mal cortadas

Rasgando a sandália de pano

Queria que as coisas voltassem atrás

Eu não faria nada igual

Ora, veja se volta, já faz tanto tempo

E eu fico matutando... cadê aquele ano?

Onde você foi parar?

Com o estômago vazio eu desisto do pensamento

Eu queria que ela estivesse aqui

Se esquentando nos meus pêlos

Suando no calor, escorrendo em minha pele

Se enfiando dentro de mim

Ela dorme esquisito, respira estranho e fala besteira

Mas eu não me importo com isso

Ela é lá do céu

Que Deus nunca esquece da gente

De vez em quando manda presente

Presente com vontade própria

Presente de pele morena

E o dinheiro vale é nada

E os bois valem só o capim esturricado

E eu não valho nem isso nem aquilo

Porque sem ela é difícil

Mas que sujeito esquisito eu sou

Como se deixa escapar um vagalume

Que pisca sem parar?

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