A Chuva

Prólogo: há doidos para todos os gostos. Existem os desequilibrados que conversam sozinhos, com plantas e animais. Sou mais louco do que todos eles porque converso com a natureza e esta envolve todo o meu universo invisível. Com este texto homenageio a natureza, cuja paz e energia que me transmite enaltece a alegria na forma simples que escolhi de viver.

No silêncio sepulcral de meu quarto, totalmente às escuras, nu, sozinho como nasci e em silêncio, onde até meus batimentos cardíacos podiam ser ouvidos, estou pensativo, quieto, introspectivo, talvez sorumbático, remoendo cogitações tristes.

Pela fresta da janela uma lufada avisa a chegada da chuva iminente, pertinaz. Ninguém será capaz de detê-la em sua simplicidade divinal.

Objetiva e determinada, ela cai e se dirige à terra necessitada com a altivez de uma rainha que se faz esperar pelos súditos. É certo que trará benefícios, tem a certeza de que será bem-vinda, quiçá ovacionada.

Há pessoas imponentes, sequiosas por ovação, que se diferenciam da chuva porque são inseguras; algo as impede de evoluir, de cair e levantar, para no aprendizado da vida e vaivém das dificuldades buscar sua liberdade através da fé, do compromisso com o bem comum, da honradez de seus atos, no equilíbrio das atitudes.

Essas pessoas, por isso mesmo, são prisioneiras de si, dos seus atrasos psicológicos, materiais e sobretudo espirituais.

Só os torpes acreditam que a felicidade encontra-se no modernismo, nas coisas sofisticadas; não vêem mérito no trabalho digno, não sentem orgulho no que se faz com justiça, que é a faculdade de julgar segundo o direito e melhor consciência, não conseguem enxergar o livre arbítrio de exercer o direito sagrado de ser gente.

A chuva, obra de arte excelsa da natureza viva, é livre e soberana. Ninguém ou nada a detém! Eu estava adormecendo com esses

pensamentos quando um sussurro sibilante, tal qual o som de

consoante fricativa alveolar sonora parecia dizer-me:

“Vem ao meu encontro, sai de teu conforto e conduza-me nesta noite para o interior de teus próprios sonhos. Sejam eles obsessivos ou não, deixa-me lavar teu pranto, ser o lenitivo de tua dor, fazer-te adormecer com meu canto, seduzir-te com a limpidez de minhas gotas orvalhadas e purificadas pela redenção de meus propósitos; permita-me satisfazer teus anseios, deixa-me acariciar teu corpo e perfumar-te com a essência de minha paz”.