[Constatações à Luz da Tarde: Cansaços]

"O alívio que tu e eu sentiremos no instante que precede a morte, quando a sorte nos desate do triste costume de ser alguém e do peso do universo." - Jorge Luis Borges

Ah, sim, estou cansado de ser-me,

O espelho mostra-me um ogro horrendo;

Estou cansado da claridade intensa das minhas memórias,

Elas me matam mal-matado todos os dias, todas as horas...

Estou cansado de ser o meu maior inimigo,

Quem ou o quê ensinou-me a arte de fustigar-me?

Estou cansado de meditar inutilmente

Sobre aquilo que tomo como erros meus;

Estou cansado de nunca conseguir parar de chegar,

E de nunca fazer cessar a ansiedade de partir;

Estou cansado de mirar os trilhos do trem,

Sabendo perfeitamente que não há mais trem;

Estou cansado de sonhar em voltar para Minas,

Sabendo que Minas não há mais - morro no Desterro;

Estou cansado de não vencer certas distâncias,

E de fazer da estrada um meio de separação;

Estou cansado, muito cansado deste enfadonho

Costume de justificar-me por minhas fraquezas;

Estou cansado de tanto viver contrariamente

A todos os meus sonhos de criança;

Estou cansado do homem em que me tornei,

É passado o tempo de pensar no que serei;

E sobretudo, estou cansado de fazer aniversários:

O farnel pesa, é tempo de parar de cumprir anos...

[Penas do Desterro, 20 de junho [de meu aniversário] de 2008]