"A descoberta"

E quando eu te pegar, com meu repertório indecente, vou deixá-lo sem a menor compaixão, corrompido de tanto me desejar. Constituindo-te assim, como território dependente daquela te fez invasão e sem pudor lhe mostrou toda a devassidão.

Contrariando a moral, sendo solidária ou não, vou deixá-lo para minha total escravidão. Curvar-te-ei em reverência à minha imagem, seja ela assim: beleza nua e selvagem; então com o licor, feito inocente Iracema, dar-te-ei de beber o meu doce poema.

Imagina-te agora, meu selvagem voraz, que por entre as linhas, já audaz, deste meu texto, caminhas. E dado passo raso, afundará em meu ninho e ficará, sem dar alarido, bem quietinho, ouvindo meus gemidos e acalmando-te os sentidos.

Quando mais tarde, do efeito alucinógeno, passar: “e velejando nós pela costa, na distância entre céu e terra, onde tínhamos levantado, nos acharão, num porto seguro, muito bom. Meter-se-ão dentro de nós, as paixões, e amainarão. E as naus-perdições, impulsionadas pelo licor, irão chegar, atrás de nós. E um pouco antes de o sol-posto amainarão também, talvez a uma légua da prudência, e ancorarão por quase toda eternidade.”

Nota:

Diálogo no parágrafo final com o fragmento abaixo, da Carta de Pero Vaz de Caminha:

“E velejando nós pela costa, na distância de dez léguas do sítio onde tínhamos levantado ferro, acharam os ditos navios pequenos um recife com um porto dentro, muito bom e muito seguro, com uma mui larga entrada. E meteram-se dentro e amainaram. E as naus foram-se chegando, atrás deles. E um pouco antes de sol-posto amainaram também, talvez a uma légua do recife, e ancoraram a onze braças.”

Assim deve ser traduzida:

Quando amantes, velejamos em um único mar: desejo, prazer, loucura e querer. Depois, passado desejo consumado, por outros mares haveremos então de navegar, porém estes proporcionarão tempestades e enfrentamentos, mas haveremos de encontrar a paz, seja ela assim: feita como única companheira.

Texto elaborado em homenagens aos amantes, que mesmo depois do pecado consumado, trazem consigo –ainda, o gosto choroso do amor do outro.