CONSELHOS AS MINHAS FILHAS.

CONSELHOS.

Aécio Kauffmann

Repara, filha,

que tu és mais aceita,

se estás na beca,

já emperiquitada.

É aparência,

mas se estás desfeita,

ficas de lado.

Logo és desprezada.

Bom dia seu.

Vai de doutor ao bode.

É o tratamento

que bem determina

o rumo certo

e co'ele tu não podes

errar...

Se segues à risco a doutrina.

Lembra-te sempre!

Toda a antigüidade

reclama, e sempre,

pela senhoria.

E não importa do cristão a idade...

da intimidade,

sempre, desconfia,

Pois veste o lobo

a pele do cordeiro

Para melhor aproximar-se dele.

Esconde as presas.

Bale até. Matreiro!

Depois... Záz. Pronto..

Mete os dentes nele.

Faze das normas

o teu breviário.

Livro-de-bolso

(bom de cabeceira)

E mais,

transforma-as,

para o uso diário,

na segurança de um par de perneiras.

Perneiras????

Sim! Não vai mudar o assunto

que, nestes versos,

o teu pai desdobra.

Onde o teu senso?

Pó! Onde o bestunto?

Não vês que estás

num bom baile de cobras!

E, quando a gente

receia encontrar-se

com as meninas

da língua comprida,

um par de botas

hay que arranjar-se

e, se possível,

de super medida.

Elas rastejam,

silenciosamente!

Porém alertas.

Prontas para o bote.

E, quando surgem,

Encimando a gente!

Para escapar.,meu DEUS!

valha-nos sorte.

Cautela, filha,

vê que esta amizade

te finge apenas,

mas. fingindo, invoca

a céus e mares a jurar lealdade.,

mas que anda louca

p'ra fazer fofoca.

Fala bem pouco.

Se puderes! Nada.

E nem te envolvas

com as costureiras

(de língua solta,

cortante e afinada)

que, ao menor galho,

já são costumeiras,

a dar no pé.

No pira... e a cair fora,

enquanto ficas,

ba-na-no-sa-men-te..

Por isto, filha,

na jogada mora.

Não entra em fria

quem ouve somente.

O mais possível,

guarda-te em defesa.

Não dá! Concordo.

Vai!! Mas, companheira!

vai te cuidando,

porque, se indefesa,

ficas na quadra.!

Vem-te a tchurma inteira.

Maispô.! Qualé!

È marcação! Bobeira!

Eu não te disse que ela disse "anssim!"

Ah! queridinha...,

era só brincadeira!

Credo! Esconjuro!

Que coisa chinfrim

E então tu ficas

com cara de tacho.

Cara de cusco

que lambeu sabão.

E, minha cara!,

a tua cara embaixo.

Niveladinha.

Bem ao rés do chão.

Eu exagero!

Cuida lá vizinha,

Que rimo apenas

co'a dura verdade.

E não te guardes

destas amiguinhas!

Logo te estrepas.

Ficas na saudade.

E, no terreno

da competição..!

Aí te digo!

Bah! A coisa engrossa!

Dormes no ponto

e já acordas no chão.

É um vale-tudo.

Uma pauleira !

Nossa!!!!

Algumas outras

são tão delicadas.

Parecem lírios

num igarapé.

Cautela, filha!.

que há minas na estrada...

E água parada

às vezes não dá pé

Mas não te encuques...

São coisas do mundo,

que ninguém muda.

Ninguém muda não,

E a gente, às vezes,

se esborracha fundo,

mesmo sabendo

onde as pedras "tão"

Mundo baixeza

e que nos envergonha,

mas que enrijece

e que nos dá valor,

se as malhas vis

da infâmia e da peçonha,

ao que, por nobre,

emprestamos cor.

Mundo de Neros

que estão sempre em cena

(foi-se o respeito.

foram-se os limites).

E, hoje, o medíocre está,

em meio à arena,

a ornejar,

buscando quem o imite,

na pretensão insossa

de que fala

co'a sensatez

de um novo Petronilho.

E, assim, vai sem cor,

nem mesmo brilho...

-capacho triste

do qual se trescala-

fétido olor

das almas deste porte.

Tão convencido

que não vê mais nada.

Perdido o rumo

pelo aplauso forte

destes sabujos

de beira-de-estrada,

que usando, a estro,

a bajulice grossa

fazem-no crer,

de fulgurante aspecto,

mesmo que o gajo

já mereça e possa

ser, de uma vez,

falso, abjeto e infecto.

Faze do horário

santa obediência.

Dos boletins...

Teu pão de cada dia.

Se sais ou entras..

dá logo ciência

Senão... te enrolas.

Entras numa fria!!!

Cuida que as ordens

sejam sempre ouvidas

por mais de uma

ou uma em quem confies.

Cuida, também,

que sejam transmitidas

a tempo e à hora.

E, filha! Não te fies

nestas promessas do depois,

que a boca

nunca repete o mesmo trecho.

E é certo

que se não pões bem cedo

a tua touca,

bem cedo

carambolarás...

decerto.

Escreve sempre.

Estão aí as penas.

pois que o grafado

não se perde e fica

a resguardar-te.

e a evitar-te as cenas

desagradáveis.

Dou-te agora as dicas..

Do fez não fez.

Do foi não foi.

Do disse.

Nestas questões,

nem a razão sustenta

a mão mais fraca.

Salvo se o teu disse

esteja escrito.

Porque aí se agüenta.

Se leva a ferro,

a fogo e até no grito.

No peito mesmo.

Vai-se até às fuças.

Mas, minha cara!,

se não há escritos....

Fica na tua,

que a coisa está ruça.

Vai com cautela e,

em cada novo encontro,

cuida os ouvidos.

A língua?...Sumiço!

Cuida da carga e

evita o tal desconto,

pois que isto sempre

vem causar enguiço.

Todo o respeito

no tratar o alheio

e aprende d'arte

de viver, a glória

de engolir sapos

sem qualquer recheio.

E, aqui, querida,

se repete a história,

Nos temas tidos

como mui verazes

e encontradiços

hodiernamente,

que assustam mesmo

qüeras mais audazes,

que se descuram

antes de ir, em frente,

a enfrentar

a selva empedernida,

o mundo torpe

em seu cotidiano

E já que, em volta,

tudo é vida...

Envida

por apreender-me,

pois que eu não te engano.

Tu em ti mesma.

Já não sei se entendes.

Falo mais claro.

Sê, tu mesma, um túmulo.

E ai! se tu cedes.

Logo te arrependes

e cedo aprendes

que esta vida é um cúmulo

de vilanias,

traições,

cinismos.

Onde a verdade

se profere à medo

que a todos causa

o farisaísmo.

(Medo à mentira,

que é o horror mais tredo.).

destas comadres,

que de si tão cheias.

de tudo sabem.

menos o que são..

E que vomitam

ditos a mancheias

nos quais,nem elas,

acreditam não.

Mas vamos lá

aos temas,

que ainda há pouco

me referi apenas

de passagem.

Aí então já te perguntas

Louco!!!

ficou meu pai?

Perdeu-se na engrenagem?

..................................................

Há quem capaz

do dedo, na balança,

pousar, de leve,

sem que alguém o veja,

a retirar do quilo

a confiança

inda que mesmo

por dez gramas seja;

há quem capaz

de discutir, irado,

o troco certo

que alguém lhe deu

mesmo sabendo,

que, dos dois, é o errado,

que a culpa é sua

e que o erro é seu;

há quem capaz

de se estender em tese,

que desconhece,

e com alento

e graça.

e mais,

fazendo

com o que diz pese e,

de tal sorte,

que lhe rendam praça;

há quem capaz

de censurar violento

seu subalterno,

e por bobeada sua,

depois, perdoá-lo,

quando é seu intento

mandá-lo, breve,

para o olho-da-rua;

há quem capaz

de se esquivar da obra

que é toda sua

e que não urge ajuda

e ainda capaz de,

co'aquela manobra,

fazer que alguém,

pressuroso, lhe acuda;

há quem capaz

de prometer alhures,

mundos e fundos

e sobre qualquer coisa

e não lembrar,

quando cobrado, algures,

e ainda jurar

sobre uma fria loisa;

há quem capaz

de soluçar, dorido,

com ais profundos

e tão comoventes,

por uma dor

que lhe não faz sentido,

por uma dor

que, nem de leve, sente;

há quem capaz

de fazer com que digam

"que exemplo raro

de amor ao trabalho"

e assim,dizendo,

muito tempo sigam

a confundir

entre o que alius e alho;

há quem capaz

de parecer alheio

ao que se transa

e ao seu redor se passa,

mas de olho-vivo e já,

buscando um meio

de entrar no bolo e

por a mão na massa;

há quem capaz

de enaltecer bugios

ou sacripanta

que lhe cause engulhos

e mais, capaz

de ao ser chamado em brios,

dobrar a espinha

sem quebrar o orgulho;

há quem capaz

de muito mais...

Se há de....

Por isto filha.

nada de emoção

que cega à gente

p'ra realidade

e faz-nos cegos

a voz da razão

Eu reconheço

que carrego as cores;

que forço um pouco

estes meus conceitos,

mas. esta é a vida..

Nua e sem pudores.

Lavado o rosto.

Cabelos desfeitos.

Mas... Este é o mas

aqui da minha história...

Podes vestí-la e

dar-lhe cor e brilho.

Mesmo escoimá-la

do que é bruto. Escória.

Usando a estro,

como a um escardilho,

tua vontade

e a intuição, serenas...

O livre-arbítrio

e a razão enfim,

p'ra separar

o inço das verbenas;

p'ra distinguir

o honrado do malsim.

P'ra burilar,

na pedra, que, ainda bruta,

intues...

oculta, medrosa,

um clarão.

Para vencer-te,

na escalada abrupta,

que é dominar

em ti toda a paixão.

Isto requer de ti

muito trabalho

-uma das Leis de ser-se.

A condição.

Nele a maneira,

nele a rota, o malho

com que forjamos

a nossa evolução.

Trabalho duro,

tão árduo e incessante,

que até parece,

às vezes, punição,

tais as sofrenças

que nos são constantes.

Mas veja bem!

Trabalho é o aguilhão

que impulsiona

e nos impele a luta.

O lenitivo

de todas as dores.

Conforto e alento

no ardor da disputa

e o corretivo

de todos os temores.

Seja qual for

o lance teu, querida.

tem os Conselhos,

sempre bem a mão.

Não custa nada

uma pequena lida,

antes que tomes

qualquer decisão.

P'ra. arrematar,

que já se esgota, agora,

o tema, a tese e

o ponto em digressão,

dá tempo ao tempo,

que p'ra tudo há hora,

e evita, sempre,

toda a discussão.

Não falo destas

discussões que buscam

equacionar

em prol do bem comum,

mas sim daquelas

que a razão ofuscam

e que não levam

a lugar algum.

O brincalhão que

, ao ar, revoluteia,

está por dentro

e só quer provocar

a discussão que,

quando desnorteia,

abre caminho

p'ro qüera acampar.

E aí tem abaixa!!

que vem chumbo-grosso,

num palavrório

de fazer corar

frades-de-pedra e,

isto é só um começo,

do que acompanha....

do que vai chegar.

Só mais um mate

e já com o pé no estribo

mais uma linha

só p'ra suplicar

aos irmãozinhos de estrada

ou de tribo

que te acompanhem

no jornadear,

pois, garimpando

nos rios da vida,

tu sentirás

o peso da bateia.

Verás, sangrando,

por calhaus feridas,

as mãos que buscam

grãos de luz na areia.

Vô Cabure