AS SIRENES
Quando as sirenes começaram a tocar
Ninguém prestou muita atenção.
Não se interromperam as conversas
Nem se deixou de comprar, vender,
Trocar vida e tempo por dinheiro.
Quando as sirenes começaram a tocar
A telefonista não interrompeu a ligação que ia em meio,
As cotações no mercado não cessaram de subir
E descer nas suas escadas vazias,
E o pistoleiro permaneceu calado
No escuro, à espreita.
A mãe não parou de amamentar a criança
Quando as sirenes começaram a tocar,
E os cães ergueram as suas cabeças, lentamente,
Alguma coisa mordendo seus cérebros.
Ninguém percebeu que não eram as sirenes costumeiras,
Dessas que anunciam incêndios
E automóveis prestes a serem roubados,
Ou o fim da aflição do operário na fábrica.
O dia ia em meio, não eram nem “as cinco en punto de la tarde”,
Quando elas começaram seu monótono refrão impessoal,
Sua canção aguda (e era a única que conheciam),
Mais simples do que a das metralhadoras soando
Ao longo de uma cerca de arames farpados,
Mais primitiva do que o grito de uma criança morrendo de tédio.
No princípio ninguém reparou — mas não tiveram culpa.
Não haviam sido avisados de que as sirenes tocariam.
Apenas alguns poucos escolhidos haviam sido treinados
Para aguardar o som que viria, repentinamente.
Esses ainda eram os mesmos, os mesmos,
Muito tempo depois, quando as sirenes silenciaram.