Marulho (a Cântico Negro)
Cheguei ao mundo e não finquei meus pés
Nem em minha terra ou em terra alguma
Havendo algo querendo que eu suma
Quem, pois, ora pra Deus, por tais marés?
O mais que eu faço vale tudo ou nada
E desse nada me vejo com tudo
Navego por um mar sem fim, contudo
Minh'alma o ama e por ele nada
Vejo-me na mais doce loucura:
Salgada água do mar em que me encontro
Uma só lágrima de Deus em pranto
Ou de seus navegantes sepultura?
Não ouço mais os cânticos de outrora
O vento afina o tom de seu marulho
E só por causa dele é que me orgulho
De talvez não querer mais ir embora
Não vou nem por aqui nem por ali
Agora fico até o sol se por
E ele há de aguardar, quando eu me for
A guiar os navegantes por aqui