Sonho e realidade apocalíticos

Sonhei que fui assassinado em meu próprio sonho,

Cavaram uma cova e me enterraram bem fundo lá.

Todos ao redor festejavam: estavam felizes e risonhos,

Enquanto me soterravam impiedosamente com suas pás.

Quando se encara as profundezas da própria morte

A Morte te vê e te seduz, nos toca e nos enlouquece.

Dentro do túmulo e lá no mundo, tudo nos esquece;

Cada ser está entregue ao acaso e à sua própria sorte.

Um ruído desconhecido e gutural arranhava o meu caixão,

Medo não senti; só havia frio, trevas, solidão e podridão.

O ruído me penetrou e pronunciou esta singela oração:

“Toda hora é hora de nossa morte, sem sentido e razão.”

Eu quis gritar, pedir ajuda, sair daquela maldita sepultura;

Nada ocorria até que mãos me libertaram desta cela escura,

E vi então dois olhos infernais que me diziam: “nunca mais.”

Escreveram na lápide "amém" com três dedos espectrais!

Aqueles dois olhos vazios de toda forma de vida

Me revelaram uma terra diferente, mas prometida;

Desde que entregasse a minha alma de bom grado,

Imortalidade e prazeres inefáveis estariam em meu fado.

Doravante o princípio e o fim, o alfa e o ômega da humana natureza,

Será dionisíaco o homem: corajoso e livre de dogmas e certezas.

O homem banhado e libertado pelo sangue de todos os deuses imolados,

Dançando alegremente, nu, sob o olhar das luas e dos sóis desmitificado.

A nova humanidade livre de cada grilhão, ideologias, mitos e preceitos.

O homem vivendo o sumo da vida e não apenas seus meros conceitos;

Deve-se transcender a ciência, o misticismo, e todos os preconceitos,

E ingerir sim os cálices do pesar e do prazer em cada ciclo imperfeito.

Sim, a beleza sublime e redentora da humana Imperfeição!

Nosso tabernáculo é o mundo com seu caos e sua solidão!

Nosso templo é o nosso corpo que não nega nenhuma vontade!

Respeito, luxúria, dor; viver é a consciência veraz da Liberdade.

“E então, ó ínfimo Poeta, o que tu achas ou pensas disso?”,

Perguntou-me a Escuridão, perto do primevo carvalho.

Cortei o pulso e fiz enfim o pacto. Estou agora submisso

A nunca ser submisso a uma lei, fados e compromissos.

[Sou o ventre da luz matinal batizada por cada orvalho.

E assim subo e desço sem rumo cada montanha e vida,

Sou a hora ávida por tudo, pois cada agora é meu oceano.

Grito e minha voz ecoa de todos os rios, montes e avenidas,

Somos todos os caminhos e estradas aguerridas,

[E ando neles como brioso e veraz deus humano.

Gilliard Alves
Enviado por Gilliard Alves em 26/01/2023
Reeditado em 28/01/2023
Código do texto: T7704548
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